É fastidioso repetir, mas a, digamos, política torna-se
igual ao futebol, que dentro das quatro linhas é a versão “civilizada” da
guerra e fora delas cada vez mais um preâmbulo
da guerra.
De acordo com a moral vigente, um adversário derrotado não é
alguém com quem tenhamos de trabalhar no dia seguinte (alguém para quem teremos de trabalhar, já que
em democracia os cargos são representativos de todo o eleitorado, não apenas da
facção). Para muitos militantes, um adversário derrotado é uma entidade que só
um inesperado resto de delicadeza impede de esmagar — ainda que não impeça de
incomodar.
Não surpreenderá que um destes dias, no calor da vitória,
alguém grite mata e a turba saia de gadanhas na mão disposta a concretizar.
Tem a ver com a insistência abusiva no termo “maioria”
ligado a democracia. A maioria decide, a maioria tem razão, a maioria determina
o destino da minoria. A maioria delibera sobre a vida e a morte.
Que conveniente é para os poderes eleitos esquecer que democracia
é permanente escolha entre alternativas — que têm, por definição, de ser
asseguradas pelo próprio sistema. É consenso mas também debate, direito à
diferença, direito a prosseguir caminhos alternativos no seio da mesma
comunidade.
A democracia foi inventada para assegurar a sobrevivência
das minorias, mas, no clímax da batalha eleitoral (como aliás no despacho dos
ministérios), o ímpeto é frequentemente totalitário — e quase sempre besta.
Sobretudo tratando-se das jotas, essas
milícias com uma bandeira no lugar da cabeça.