quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O remorso de Valter Hugo Mãe

Abel Barros Baptista escreve na Ler uma crónica sobre o caso Valter Hugo Mãe e as minúsculas. Parece que alguns daqueles que antes lhe grafavam o nome como o próprio, em minúsculas, passaram a usar as maiúsculas desde que o autor se converteu à normalidade (talvez vencido pelos remorsos). Há quem dance conforme a música. É divertido. E seria ainda mais se no próximo livro Valter resolvesse baralhar de novo, por exemplo escrevendo apenas minúsculas no início das palavras. vALTER hUGO mÃE. Segui-lo-iam?

Referida assim, a questão até parece do domínio do capricho. E é. Que mais se pode chamar às opções de Valter Hugo? O uso exclusivo das minúsculas só era uma questão de estilo no sentido que a moda emprestou à palavra: oco, fútil, efémero (como aliás parece agora provado). Na literatura, o estilo não tem exactamente que ver com a forma como o escritor utiliza a tipografia. (Se assim fosse, o autor que usasse sempre a fonte Avant Garde seria talvez de imediato um vanguardista.) O estilo de Saramago, por exemplo, não se define pela escassa utilização de pontos finais e sua substituição por vírgulas, embora isso seja fulcral na obra. A pontuação usada como ele a usava estava ao serviço do ritmo, da sonoridade, da forma de pensar e narrar. Com Valter Hugo Mãe e as minúsculas não era isso que acontecia.

Creio ter lido algures uma entrevista onde o autor referiu que não usava maiúsculas porque queria que a leitura fosse mais torrencial, sem se deter muito, sem tropeçar nas maiúsculas, portanto. Ora, o que determina o ritmo da leitura é a narrativa, o enredo, a construção das frases e a pontuação, não a forma como se utilizam as maiúsculas. Tanto quanto posso julgar pelo único livro de Valter Hugo que li, a sua prosa (que tinha personalidade, mas por outras razões) não se distinguia por uma pontuação particular. Pelo contrário, lembro-me de que em certas passagens havia uma boa quantidade de vírgulas a ceifar, ali postas à maneira clássica. Se o objectivo era acelerar, o escritor rejeitara oportunidades de aliviar os travões. E a ausência de maiúsculas, sendo inesperada e contrária aos automatismos da prática da leitura, até atrasava.

Embora descobrisse no processo que não era o meu género de literatura, passei uma tarde agradável com O Remorso de Baltazar Serapião, mas cheguei ao fim a achar que o próprio escritor devia sentir remorsos por se envaidecer de tão obstinada e fútil originalidade.

Como em Saramago (ou em Lobo Antunes), o leitor despreconceituoso, ao fim de algumas páginas de leitura persistente, entra naquele universo e vai progressivamente dançando ao som da música do autor (neste contexto a dança é legítima). Mas a questão é se vale a pena o esforço. Talvez se descubra que sim, que vale a pena, mas não é certamente pelas minúsculas — inúteis, contraproducentes, caprichosas e alheias à literatura como os piercings de José Luís Peixoto.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

O sentido do fim



Se vista da serra, a cidade adormece imergida num mar de nuvens. O noctâmbulo caminha nas suas ruas como se a terra fosse outra, tal a acção do nevoeiro nos objectos, nas formas, na luz, na arquitectura, na atmosfera. Puxa as golas do casaco para proteger o pescoço do frio. O dia amanhecerá gelado; a temperatura desceu e aquele manto branco, que não pretende levantar acampamento, não vai deixar entrar um raio de sol. É quase inconcebível evocar o Verão em tais circunstâncias, mas era isso que o caminhante pensava fazer, o Verão como marco miliário na distância, ponto de fuga da tela onde ele é figurante, éden cíclico aguardado com devoção religiosa. Se a revista conhecida lhe perguntasse como gostaria de morrer diria ligeiramente bêbado à beira de uma piscina. Contudo, pensa no corpo nu sob o astro e não é daí que lhe vem o conforto agora, mas da ténue protecção do casaco, da energia da caminhada vigorosa, do silêncio e da solidão extrema que um banco de nevoeiro pode proporcionar. Os carros e os transeuntes ficam em casa, tementes da humidade silenciosa, ameaça cinematográfica, e os adolescentes deixam a parvoeira para outra altura da semana, não apetece grunhir nem partir garrafas na rua em noites assim. Alguém acendeu uma lareira rústica algures, talvez um fumeiro nostálgico num anexo ou garagem, custa a crer que o lume ou o fumo tenham aquele cheiro na cidade. Decerto lenha trazida da aldeia, depois de uma temporada no alpendre, sabiamente cagada pelas galinhas e pelos gatos e pelos pássaros, curtida pelo sol e pelo vento que se esgueira entre friestas de muros de hortas e lameiros e paredes de combarros. Não, o Verão não permite este alheamento, esta deslocalização, este passear a alma por paisagens distantes sem abandonar a geografia do quotidiano. Não quando se está sóbrio, pelo menos. Pensa que talvez possa descrer do Verão sem cometer heresia. Afinal, tem de recordar que também gosta da chuva quando ela cai em Novembro, gosta de se abrigar como no útero a escutá-la com atenção, ou de levar com as suas pingas enquanto corre, o cabelo empastado e o poliéster do casaco permissivo. E gosta da geada, que deixa o céu todo à mostra, o universo primordial à vista desarmada. Da neve, luzente e também silenciosa, excepto quando estala debaixo dos pés. Não, não é o Verão — são os elementos todos. Isto não é bem uma conversão, embora seja uma epifania: o noctâmbulo é afinal devoto da intempérie como do tempo favorável. Aceita a tormenta e a bonança. Um progresso ou um prenúncio de união panteísta? Lembrança que o pó ao pó volta? A felicidade não mora assim tão longe da melancolia.

*Não, não tem a ver com o (muito recomendável) livro cuja capa e título usurpa.

Recado ao artista quando jovem

O candidato a escritor que vive a tentar equilibrar o trabalho de fundo com a diarística de um blogue um dia descobrirá que há vertentes incompatíveis na escrita. Um post de cinco linhas impede uma página de romance. Inversamente, o trabalho de fôlego faz hibernar blogues por um longo período.
A declinação das editoras surge então como convite a voltar ao trabalho, tem esta faceta positiva. É quando chega a carta com a fórmula amável que o escriba retoma o verdadeiro ofício. Uma recusa é um aviso de que o recreio acabou, já não é sério viver à sombra da obra feita. Porque não existe obra, di-lo a fatídica missiva.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Teatro Nacional

Quando Vasco Pulido Valente, a propósito do Dona Maria, insiste no «fracasso» da dramaturgia nacional como uma das duas razões para no seu entender se extinguir a instituição, dir-se-ia que na sua cabeça está um Teatro Nacionalista, não um Teatro Nacional. Não é estranho que à época da sua instituição o TNDM II pretendesse criar um repertório nacional, mas seria estúpido que mais de cento e cinquenta anos depois essa permanecesse a única ideia ou a ideia fundamental (quando, aliás, Shakespeare entrou naquela casa logo no século XIX). Ainda que aceitássemos nada se ter escrito no domínio dramatúrgico em Portugal que valesse a pena, caberia contudo explicar porque não se justifica um Teatro que apresente peças estrangeiras. O chauvinismo não parece ser razão séria — e é talvez pouco respeitável alguém que defenda um Portugal fechado sobre si mesmo.

A outra razão que VPV aponta é a inexistência de público para o teatro em Portugal. Este argumento não é de todo destituído e, apresentado na sua forma simplória, colhe em vários círculos pensantes e decisores. Poder-se-ia argumentar que, por exemplo, as Finanças em Portugal também não têm uma audiência fácil, mas nem por isso deixam de tentar existir. A resposta é que as Finanças são fundamentais para a sobrevivência do país, o teatro não. É verdade. Mas de que país estamos a falar?
Um país que dispensa o teatro com este argumento dispensa, por coerência, todas as manifestações culturais “eruditas” (ou não comerciais). Não significa isto que os utentes são necessariamente os mesmos, significa que — do teatro à literatura, da dança à história, das artes plásticas à filosofia, da cultura clássica à mais contemporânea — são todos minorias, pouco relevantes, se avaliados por uma estatística cega.
Ora, um dos deveres democráticos de um Estado é assegurar uma sobrevivência digna às suas minorias — mesmo que antropologicamente, se quiserem. Depois, se pretender integrar uma certa ideia de civilização, poderá tentar fazer mais alguma coisa.
É claro que muitos convivem bem com ideia de choldra, até para poderem continuar a usar a sua gramaticazinha queirosiana. Mas não parece ser essa a função de um Governo.

Excedeu-se o Estado português neste seu labor de assegurar a “alternativa democrática” na área da cultura? Com um orçamento significativamente inferior a 1% do OE não parece ser o caso. Tanto mais que o investimento público na área do entretenimento, da festa pura e dura, do pimba, é superior. Mas isto, mesmo que inútil, é popular, concorrido — e, enfim, não se intromete no quintal do cronista.

domingo, 27 de novembro de 2011

Plural majestático

No snack-bar, o empregado usa por sistema a terceira pessoa do plural com os clientes, ainda que estejam sozinhos. «O que ides comer?» «Já tendes a conta?» «Como quereis o prego?» «Ainda não vos trouxeram o fino?» «Ora aqui está o vosso troco.» Talvez o faça para não ter de pensar na formulação correcta quando por exemplo pergunta a um cliente se já encomendou: no contexto das suas intervenções, «já pedistes?» nunca é erro.
Infelizmente, o serviço nem sempre corresponde ao tratamento. Somos majestades para as suas palavras, mas não para a sua prestação, sofrível. E quando de repente o ouvimos perguntar «já acabaste?» sentimo-nos incomodados. As suas palavras não soam apenas a súbita intimidade, mas a verdadeira impertinência, desaforo. Um tipo habitua-se a ser tratado como merece e depois ressente-se.

Ulan Bator

Guimarães Jazz 2011. O crítico Nuno Catarino viaja a convite da organização do festival. Na abertura do seu texto declara que o evento é um caso de sucesso «apesar da sua localização condicionante». É um elogio, claro. Mas é também a habitual menorização de tudo o que não é Lisboa. (Exercício para o qual, aliás, os próprios provincianos geralmente concorrem.) Lisboa estranha casos de sucesso em terras inóspitas. Lisboa, a Lisboa jornalista, a maior parte das vezes só viaja para locais assim «a convite», como quando vai a Ulan Bator. O seu âmbito é o do termo da aldeia capital, e não apenas por uma questão de orçamento. Se alguém tem a ideia peregrina de fazer coisas a mais de uma légua, prepare-se para «convidar» os jornais se quiser ter reportagens e críticas. E mesmo assim é preciso que ao jornalista apeteça a estafante viagem.

Sobre a inutilidade do debate online

Who cares, idiots arguing on the internet. What’s the worst you can do? CAPS LOCK EACH OTHER TO DEATH?

Freqeist, no Youtube, comentando uma discussão sobre a cover dos Radiohead do tema “Wonderwall” (Oasis).

Escroques

Se os escroques permanecem, porque passou a palavra de moda?

Fernando Gouveia, algures em Portugal

Prove que é humano

Uma operação na Internet pede-me a dada altura: «Prove que é humano». Fico a olhar para aquilo, perplexo. É um pedido e pêras, para uma hora tão matutina. É um pedido exigente em qualquer altura, aliás, sobretudo tendo em conta que o espaço que me é dado para escrever é ridiculamente minúsculo. Eu já estou a pé (mais ou menos), mas ainda tenho de ir acordar a Filosofia. Ou ir bater ali à porta do meu amigo Zé. Inequívoco e conciso, eis o que me é pedido que seja. Ensaio duas ou três ideias, mas nenhuma cabe em tão apertada caixa. É então que me dou conta que o que se me pede é que copie duas palavras aleatórias escritas com letras manhosas logo acima do espaço da resposta*. Só isso. Para ser humano basta saber copiar. A que ponto baixaram a bitola. E eu que estava a ser estúpido — talvez nem precisasse de transcrever as letras para provar a minha humanidade.

* Captcha.

sábado, 26 de novembro de 2011

O funcionamento do mundo

O indivíduo espreita os seus e-mails e, sabe o diabo porquê, detém-se num que alerta para determinado perigo, certo esquema criminoso ameaçador para a bolsa privada e a saúde pública. Por vezes o filtro deixa escapar algumas destas mensagens. E outras que prometem aumentar o pénis ou depilar sem dor. (Depois do susto, percebe-se que pénis e depilar são felizmente palavras sem um radical comum.) Resolvido a perder tempo, o indivíduo abre o e-mail em análise. A coisa, tantas vezes reencaminhada, tem múltiplos pontos de exclamação e um rasto que remonta a 2009. Neste momento o indivíduo fica fascinado e parte para o Google em safari. Antes de chegar à região dos Grandes Lagos, descobre um blogue que postou o mesmo alerta e foi alvo de uma centena e meia de comentários. As reacções são de susto e indignação. O texto interessa às pessoas, preocupa-as, assusta-as, como era seu objectivo. Elas têm opiniões sobre o assunto, teorias, denunciam possíveis conspirações. Não tarda Deus é invocado, os astros, o próprio demónio. A discussão na caixa de comentários divide-se em duas abordagens: a conspirativa e a esotérica. (Alguns intervenientes jogam nos dois tabuleiros.) Os insultos entre facções afloram. Lá para o trigésimo quinto comentário, um dia depois da postagem, uma alma intervém pela primeira vez e comunica que recebeu o e-mail, notou que havia nele um nome, uma instituição e um número de telefone que pretendiam credibilizá-lo. Ocorreu-lhe que ligar para aquele número poderia evitar alguns equívocos. Fê-lo. A pessoa e a instituição existiam, mas jamais tinham emitido tal alerta, aquilo era uma fraude, já a conheciam mas nada tinham podido fazer.
A caixa de comentários do blogue fica por instantes perplexa, nota-se uma pausa na cadência das intervenções. Depois os seus habitantes retomam a actividade normal, os místicos insistem na influência das forças ocultas e os crentes em conspirações aludem ao governo e a certas corporações. Nenhum se deixou perturbar pelo instante de sensatez que acometeu o funcionamento do mundo.

Por volta do centésimo comentário, o observador retira-se, confiante. O debate não voltara a distrair-se das questões essenciais e os insultos continuavam em crescendo. Dois anos depois ainda havia gente a reencaminhar a boa nova.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Guarda-roupa

Brotando das cabeças onde se acoitam, as ideias e as ideologias determinam o visual do espécime, começando logo pelo corte de cabelo, cujas raízes, como se sabe, contactam com as sinapses. As rastas e os keffiyeh são exemplos sobejamente conhecidos em certa esquerda, mas nunca se fala suficientemente das opções estilísticas da direita. Não são muitas nem muito imaginativas, é verdade, mas há alguns aspectos amorosos. Como o fato british, com riscas mais ou menos subtis, os sapatos de vela e as parkas (mesmo que se esteja a milhas do mar), o cabelinho penteado para trás ou de risca ao lado (evidenciando muitas vezes a calva — que os portadores tomam por testa longa — como se evidenciasse um cérebro grande), cobrindo as orelhitas por causa da geada ou dos zunzuns, encaracolando na nuca, o gel à Zezé camarinha, a gravata a toda a hora como yes men ou caixas de bancos. Há uma utilidade nestas opções, como havia no tempo de Napoleão: na guerra, identifica-se bem o inimigo pelo uniforme. É disso que se trata, uniformes de facção, fardas de funcionários. E não custa imaginar os mais zelosos das respectivas causas a marcharem como idiotas em levas ordeiras, obedientes, ao som do tamborileiro que lhes calhe.
Não tenho a sorte destes funcionários. Durante anos, o meu pobre guarda-fatos parecia o armário de quatro ou cinco tipos diferentes. As minhas manhãs eram como as de certas mulheres, só que eu gastava o tempo a decidir, não a aprimorar a maquilhagem. Nunca tive lá calças afegãs nem fatos de riscado, é certo, mas havia dias em que ao sair de casa poderia ir acorrentar-me a uma central nuclear e outros em que me deixariam entrar no clube mais restrito. Bem sei, isto pode revelar alguma confusão mental, indefinição, indecisão, incerteza. É verdade. As minhas certezas são poucas, e nenhuma a respeito de fardas. Ou antes, sobre isto uma certeza: não visto.

Eu hoje acordei assim

O post anterior podia ter o título de uma rubrica célebre na blogosfera. Se tivesse saído cara.

Saiu coroa



A propósito disto.

A lógica machista

«Uma afegã de nome Gulnaz, de 21 anos,enfrenta um terrível dilema: ou permanece na prisão com uma filha pequena,cumprindo pena por ter sido violada por um homem casado, ou contrai matrimóniocom o agressor para poder sair da prisão.»

O “dominó democrático” de Bush falhou logo onde era para ter começado. Mas por cá não temos motivos para estar satisfeitos. A lógica machista ainda impera, e na sua versão mais aplicada deixa um rasto de sangue quotidiano. Não somos civilizados, não. Uma parte de nós continua besta como sempre. Talvez os filhos varões devessem ser educados com bonecas e aulas de ballet durante umas gerações. Ou postos de sopeira por uma temporada, como antes se mandavam para a tropa. São ideias.

A lógica cómica

Diz-se por aí no submundo (ou mundo real) das caixas de comentários que a greve é uma coisa da função pública. Os trabalhadores do sector privado têm medo de perder o emprego. Ora, isto que pela lógica pareceria uma crítica ao despotismo dos patrões, ao cerceio de direitos democráticos, é na verdade mais uma crítica ao “funcionalismo” público. É cómico, pronto.

Asimov, Isaac

O projecto de construção era optimista ou mal-informado, talvez info-excluído, por isso o supermercado abriu com mais de 20 caixas. Funcionaram umas doze nos picos consumistas dos primeiros anos e cedo a média se ficou pelas cinco ou seis. A seu tempo a tecnologia arribou, e as quatro caixas automáticas (ou self-service) instaladas reduziram as restantes a três. Nos melhores dias. Ontem estava bom para a leitura, caso os funcionários fossem adeptos ou estivessem autorizados a ocupar o tempo livre dessa forma.
Não é apenas a crise, a recessão, a baixa do consumo. É a tecnologia. E a terciarização da economia. E este é o momento Asimov do blogue.
A não ser que mantenham a todo o vapor máquinas absurdas como a da construção civil (manifestamente excessiva já na última década) ou que inventem novas necessidades consumistas (enquanto houver combustíveis e matérias-primas e clima favorável), os países ocidentais dificilmente conseguirão empregar a maioria dos seus cidadãos no futuro. Excepto, claro, se a globalização voltar atrás, se as importações forem altamente taxadas. Por isso, no futuro o trabalho será partilhado, as pessoas terão finalmente mais horas de ócio, assistiremos a uma melhor redistribuição da riqueza (não voluntária, evidentemente) para assegurar a viabilidade das sociedades. Ou então filmes como o Mad Max e livros como A Estrada serão a realidade sem que seja preciso rebentar uma só bomba nuclear.

Painel de… especialistas

Os especialistas que comentam (de véspera) a greve nos jornais fazem-no do fundo da trincheira. À esquerda, manifestam (sem utilizarem a palavra) esperança numa grande afluência e em resultados da acção. À direita, condescendem, pronto, com o direito constitucional mas não disfarçam o desprezo pelo conceito. Nada de novo na frente ocidental.

Pseudo

Há palavras fetiche. Pseudo não chega a ser uma palavra, mas é um elemento de adjectivação que muitos gostam de cometer. O seu uso mais frequente é como prefixo da palavra intelectual. Ninguém é intelectual hoje em dia, os que estão mais próximos disso são pseudo-intelectuais. Ora, tendo em conta o valor semântico actual do termo, tendo em conta que não é bem visto ser-se intelectual, chamarem pseudo-intelectual a alguém até pareceria uma demonstração de apreço. Contudo, a gramática leva ainda mais voltas, e se intelectual é já insulto, pseudo-intelectual é, do ponto de vista da intenção, duplamente insultuoso. Como doido-varrido. Ou besta-quadrada. No uso do vulgo, pseudo não qualifica de falso o termo que lhe sucede, com a intenção de negar a suposta virtude ao alvo, mas reforça a conotação pejorativa que a palavra tem na nova língua comum.
As ocorrências do fenómeno com que deparei mais recentemente relacionavam-se, é curioso, com a mesma pessoa. Um simpatizante do Secretário de Estado da Cultura classificava de «pseudo-críticos» os tipos que questionavam a actuação do Governo neste campo. Já uma subscritora da petição «As Artes e a Cultura para além da crise» (uma pseudo-crítica, portanto) apelidava Francisco José Viegas de «pseudo-escritor».

É divertido que utilizem a língua desta forma erudita pessoas que pretendem ter ideias para a Cultura.

Os posts são como as cerejas

Não era isto que devia estar a fazer. Um blogue é a maneira que a pessoa encontra de adiar o sono e os compromissos que tem consigo mesma. Não é voluntário, os posts são como as cerejas. Ou não é voluntário porque Alguém ou alguma coisa decide pela pessoa onde melhor deve perder o seu tempo. Talvez toda a iniciativa humana seja fútil e a vocação que um tipo julga ter não é necessariamente a vocação de que o mundo quer desfrutar. Um blogue é uma das muitas maneiras que temos de fracassar ou de falhar o destino.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Exactamente

http://delitodeopiniao.blogs.sapo.pt/3757643.html

Medrar

Há não muito tempo, o que se ouvia cá em cima era uma flauta a tentar ser afinada e harmoniosa, às voltas com melodias populares ou obras clássicas para iniciantes. Nessa altura, a proverbial forma lusa de construir blocos de habitação não vinha ao caso. Pelo menos não a propósito desta faceta da vida íntima da vizinhança. De resto, o esforço divertia, evocava memórias, permitia acreditar na persistência da arte. Mas entretanto o rapaz cresceu, tornou-se pré-adolescente, largou a flauta. O seu repertório, atravessando as finas paredes e lajes ou subindo pela canalização do edifício, quase se resume agora a famosos hinos de estádio, entoados numa voz que quer (mas nem sempre consegue) ser grossa e façanhuda como as demais.

Bartleby ou o indivíduo e as suas estonterias

Muitas fotografias de escritores são feitas em frente às suas estantes. No seu caso, não tivesse falhado o destino por outras razões, havia uma decisão que o tinha livrado desse lugar-comum.
A última mudança de casa deixara para trás os livros acumulados. Como todas as mudanças, aquela era provisória, não havia urgência de empacotar a livralhada para a viagem. Além do mais, havia-lhe sido detectada uma certa tendência para deixar o lastro pelo caminho. Os livros ficavam, de qualquer modo, à guarda de um ente próximo, salvaguardava-se assim a possibilidade de um feliz reencontro (do indivíduo e dos livros).
Contudo, o contrato de arrendamento da morada anterior foi denunciado antes que houvesse progressos de carácter na nova morada. Havia que regressar e carregar as caixas, encher novas prateleiras. Ou talvez não. Poderia evitar-se o lugar-comum arranjando outro lugar para os livros. Em vez de recuperar a biblioteca e arriscar a possibilidade de um dia ser fotografado em frente a ela, o indivíduo podia doá-la. Afinal, sempre acreditara que a grande qualidade dos livros era poderem ser lidos por várias pessoas em vez de acumularem pó em estanterias burguesas.
A concretização do gesto expô-lo à possibilidade de passar por benemérito. Afastou o embaraço decretando que tinha sido a preguiça de carregar caixas e não a generosidade a movê-lo. Modéstia, disse a instituição agraciada, ninguém se livra assim de algumas centenas de livros. Modéstia, aceitou pensar de si próprio.
Anos depois descobre-se a contemplar uma fotografia do poeta sueco Tomas Tranströmer em frente às suas estantes. Não lhe é possível imaginar-se naquela posição. Não tem talento nem livros em quantidades suficientes. Algures no passado as suas decisões alienaram-nos (um homem é o resultado das suas opções). Mas não é sobre isto que reflecte. O que pergunta a si mesmo ao contemplar as lombadas do sueco é quem, da multidão que o habita, se desenvencilhou dos livros? O preguiçoso? Aquele que não gosta de viagens de regresso? O tipo que ambicionava morar em hotéis, sem memorabília? Ou o leitor desprendido e solidário?
Pensar nos equívocos convoca a melancolia. Resolve perguntar-se, espreitando por cima do ombro, se não está a crescer desmesuradamente a nova colecção de livros. Se não está, de novo, a expor-se ao risco de ser um cliché fotográfico. Enfim, se não está na altura de mudar de casa.

Governo contra os despedimentos e a favor das progressões na carreira

Se não tresleio a notícia do Correio da Manhã, a assessora de imprensa do Ministro da Economia foi considerada incompetente (falhou a missão de propaganda). Por isso foi…. Não, não foi despedida. A ex-jornalista do DN, depois de tornada a assessora mais bem paga do Governo, vai passar agora para a administração do Turismo de Portugal. Deve ser a crise.

A greve ou um manguito

Amanhã ou faço greve ou um manguito. Não por causa dos cortes nos salários e nos orçamentos. Mas para mandar para o raio que a parta a direitinha oportunista que se aproveita da crise para implementar a sua visão cinzenta e estreita do mundo. E os idiotas úteis que tendem a achar que sim, que com a crise a democracia se pode suspender. Suspendam isto!

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Sábado à noite

Morena, vestida de escuro, ar trágico. Senta-se e um dos empregados logo lhe traz a ementa. Ela recusa, delicada, espera mais alguém. Escolheu ficar de frente para a televisão. Fixa-a como se olhasse através da janela, nas pausas de espreitar por cima do ombro a entrada do restaurante. Os minutos passam. Um segundo empregado, de passagem pelo sector, repara nela. Amável, deixa a ementa que traz debaixo do braço. Ela recusa, diz num quase sorriso que espera mais alguém. O dono acaba de regressar do seu cigarro na rua, nota a cliente sem menu e imagina incompetência do pessoal. Num resmungo, ataca o móvel das entradas e, já simpático, pergunta se «é sozinha». Ela recusa mais uma vez a ementa, pede que recolha as entradas, ainda espera alguém.
Há uma quarta pessoa de serviço na sala. É probabilisticamente possível que lhe perguntem de novo, como se fosse a primeira vez, se está sozinha. Mas seria a sua quarta resposta, a quarta vez que negaria a si mesma a evidência. Levanta-se. Recusar a ementa não foi uma deferência para com quem haveria de vir. Foi um acto preventivo. Não tem nada a pagar. Pode sair sem enfrentar os olhares do pessoal.  

A Cultura, no imediato

João Carvalho, no Delito de Opinião, tem ideias sobre Cultura. A mais esclarecedora diz que «a Cultura não dá de comer no imediato a quem tem fome». É todo um programa.
Nesta, como noutras matérias, o blogger é feroz apoiante do Governo. Por alguma acção em concreto? Não. «A Cultura institucional está entregue a um homem de cultura que nada tem a provar para fazer currículo. Chega-me.»
O Secretário de Estado nada tem a provar, portanto. Em caso de dúvidas, basta-lhe abanar o currículo nas ventas dos críticos. (O que, sendo Verão, até ajudava a poupar no ar condicionado). Mas já que Carvalho se satisfaz com pouco (é mais um adepto da frugalidade) e chegando-lhe o perfil do Secretário de Estado, não estaria disposto a aceitar uma silhueta recortada em cartão? Ainda seria mais económico.

João Carvalho não apoia veleidades na área da Cultura porque, enquanto apreciador do Secretário de Estado, quer protegê-lo duma doença que afecta «a mais distinta intelectualidade da nossa praça». Parece que «os mais iluminados, quando se vêem a decidir, perdem depressa a imaginação criadora e a acção raramente ultrapassa a simples distribuição de verbas». Pelo sim, pelo não, abstenha-se a Secretaria de «ideias geniais». Talvez um diploma emoldurado na parede chegasse para o serviço que é necessário.

Mas será o cheque em branco de Carvalho uma apologia da inércia? Não, nada disso. Na verdade, há acções da Secretaria de Estado da Cultura que João Carvalho aplaude vigorosamente. O seu post, de resto, é espoletado por uma dessas acções: o despedimento de Diogo Infante. Claro que, em rigor, decisões do género (mesmo que correctas) não são exactamente medidas culturais, mas actos administrativos. Ora aqui é que bate o ponto: depois de um currículo, a opção de João Carvalho para a Secretaria era talvez um mangas-de-alpaca, alguém com jeito para subtracções e sem o perigo das ideias.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Irritações 2

Ignoro como seja Vasco Pulido Valente na sua existência real. Apenas conheço a persona que se projecta a partir dos textos que ele escreve. E esta por vezes* faz-me pensar em certos escritores que deixam de se interessar pelo seu tempo, pelo menos enquanto intervenientes, já só vivem para a posteridade. Perguntam-lhes por autores vivos que eles admirem e eles têm um gesto de enfado. Todos os que são dignos de louvor estão mortos e enterrados, não pertencem a esta época. Jovens promessas das letras? Não lêem, não acreditam, não têm tempo nem paciência. Quando não estão a escrever, relêem os mestres. De resto, já não crêem na literatura, os livros vão desaparecer. Talvez alguns grandes vultos sobrevivam. E, sim, admitem se instados, modestos, ficariam contentes se uma ou outra obra sua se incluísse no panteão.
Esta não é uma arrogância nova, repete-se a cada geração ao longo da história. Em certos espécimes envelhecidos, a falta de generosidade e o egotismo vencem o sentimento de pertença e a curiosidade. A urbe é a certa altura para estes pessimistas como as trezentas concubinas para o geronte Salomão de A Cidade e As Serras: um serralho «ridiculamente supérfluo». Mas, como diz Jacinto, não são exactamente as concubinas que se tornam imprestáveis.
Talvez a literatura acabe, mas será por falta de leitores, não de escritores. Se estes Schopenhauers (para nos mantermos na perspectiva do Jacinto queirosiano) não estivessem publicados, se não tivessem sido lidos, se mantivessem um mínimo de abertura e curiosidade em relação ao que se produz no seu tempo, talvez vissem o problema pelo lado certo. A época não tem falta de génio criativo — tem falta de público. Décadas antes, as pessoas eram postas no caminho das obras, literárias ou outras. Agora, com conivência geral, as obras são afastadas do caminho das pessoas, como obstáculos que impedem o avanço da carroça.
Estes jubilados podem já não ter ânimo para ir admirar ou agitar as artes — mas escusavam de ser tão prestimosos a promover o enterro delas. Escusavam de pôr o seu prestígio ao serviço da actividade funerária.

*Ver Público de sexta-feira.

Não há dinheiro…

É obscena a alegria mal reprimida com que alguns repetem «não há dinheiro». Nem sequer parecem pais a enxotar filhos chatos ou perdulários. O sentimento dos progenitores nestas situações pode ser tédio ou irritação. Mas decerto nenhum pai diz a um filho com alegria (ou sequer tédio ou irritação) que não há dinheiro para o médico, para os cadernos, para aquecer a casa, para o doce há muito augado. Os pais muitas vezes procuram, por necessidade estratégica, desvalorizar as dores e os anseios dos filhos, mas nunca ficam satisfeitos por os negar ou contrariar. Tristeza, manifesta ou contida, é o sentimento humano para estes casos. Alguns tutores particularmente pragmáticos podem arvorar uma certa indiferença — perdoa-se-lhes, é a forma de não permitirem que as emoções dificultem o que têm de fazer para a sobrevivência da família. Mas outros estados de espírito são inadequados. A alegria mal reprimida é bizarra. Faz desconfiar que há um sádico em casa, alguém com ressentimentos mal resolvidos.

…é uma alegria

Esta satisfação com a escassez do dinheiro tem nalguns casos uma razão conhecida. Há tipos que vivem mal com os interesses alheios. Se mandassem (e agora mandam, ou pelo menos mandam bitaites), a sociedade haveria de se reger pelos seus interesses particulares. O que eles não necessitam, não consomem, não frequentam, não utilizam ou não apreciam pode simplesmente acabar; por extensão do seu ego, não faz falta a ninguém. Até aqui, sentiam alguma dificuldade em convencer toda a gente de que aquele ponto de vista era racional. As pessoas não são sempre estúpidas, por vezes percebem quando estão a tentar decidir por elas. Contudo, a crise instalou-se, e com ela chegou por fim o argumento de que os tipos necessitavam: não há dinheiro. Agora podem abrir a boca e parecer sensatos. O argumento é real, as pessoas são sensíveis a ele. Os despotazinhos podem finalmente afunilar a sociedade ao seu critério que a intenção não é percebida por todos. E ei-los aos saltos, afogueados, a berrar a toda a hora e em todo o lado o seu mantra: Não há dinheiro, não há dinheiro, não há dinheiro. É uma alegria.

sábado, 19 de novembro de 2011

Bonnie and Clyde

Um casal passeia no parque, pisando as folhas coloridas do Outono. São muito novos, mas vestem como adultos, com uma elegância clássica. Ela tem um penteado de diva de cinema, louro, ondulado, enrolado nas pontas como em certas fotos de Marilyn Monroe. No rosto, a acne trai a idade. Ele penteia-se com uma perfeita risca ao lado e talvez um pouco de gel. Imberbe. São ambos esguios, altos, caminham como modelos numa foto-reportagem de exteriores. Agora detêm-se junto a uma árvore. Talvez seja a hora do beijo, Casablanca ou outro. Ela baixa a cabeça, mexe na carteira que traz ao ombro. Ele aguarda. Sabe o que vai sair da carteira, devem ter falado nisso. A pessoa aproxima-se no seu jogging, a espreitar a cena. Por instantes, imagina que a rapariga vai tirar um espelho oval, antigo, com uma pega, para retocar o penteado e talvez o batom. Mas nos headphones soam temas de Nick Cave, Murder Ballads — não dá para afastar o pressentimento de que da carteira sairá uma pistola, que Bonnie and Clyde se preparam para assaltar um pobre transeunte em calções. Por desfastio. Ou porque estão informados da descapitalização dos bancos.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Irritações 1

Para Vasco Pulido Valente não há nada no país que valha realmente a pena. E nem vale realmente a pena tentar promover seja o que for. Por ele, o país fechava e deitava-se a chave fora. Vasco Pulido Valente é um velho resmungão, possivelmente misantropo. Escreve livros que a esmagadora maioria das pessoas ignora. No entanto, ninguém questiona o seu direito a escrevê-los e publicá-los. Durante anos, ninguém questionou o seu direito a investigar ao seu ritmo e ser pago para isso. Se aplicássemos à sua obra os critérios demagógicos que hoje vigoram e que ele aplaude, talvez lhe estivéssemos a pedir indeminizações.

Interessante

O Secretário de Estado da Cultura terá dito que as autarquias «asseguram já 60% da produção cultural». A notícia não desenvolve, mas seria interessante perceber como se relaciona esta afirmação com aqueloutra de tempos eleitorais em que Viegas dizia ser preciso acabar com o financiamento das autarquias à música pimba.

Moderação

«Passos fala em moderação salarial no privado». Naturalmente o primeiro-ministro não se refere aos salários dos gestores ou aos rendimentos dos accionistas. Mas não é esse o ponto deste post. É a escolha de palavras que desperta a imaginação. Haveria quem no lugar daquele termo usasse redução, rebaixamento, algo do género. Mas nós conseguimos ver Passos a hesitar entre parcimónia e frugalidade. Morigeração também ia bem com a sua mundividência. Na verdade, todos os oito sinónimos do Word ficam a matar quando está em causa um estrilo retro.

Flagelo

Quando lemos um post como este do Lathe Biosas perguntamo-nos o que aflige mais o autor. 

Caça às bruxas

Temos de nos resignar aos cortes, ninguém desencantou ainda uma alternativa milagrosa. E é na verdade bom que as instituições aprendam a cumprir orçamentos, mesmo que eles já fossem curtos antes dos cortes. Não é sensato nem legítimo agir de outra maneira. Mas o Governo e os escribas seus apoiantes tinham necessidade de transformar uma dieta numa caça às bruxas? Se há instituições que não vão ser fechadas (porque certamente os Governo as considera necessárias, queremos acreditar), custava manter um discurso positivo acerca delas em vez de cavalgar a onda populista que, mais um pouco, toma o freio nos dentes? É isto descontrolo, nervos à flor da pele, ou estratégia de terra queimada?

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Velhos amigos

A ida ao multibanco era para ser um instantinho, mas a senhora estava à frente e tinha contas para pagar, carregamentos a fazer, saldos a consultar. Ele esperou, fingindo que não espiava as operações para entreter a impaciência. Finalmente a senhora retirou-se e sorriu, em jeito de desculpa. Ele levantou o seu dinheiro e foi buscar o carro. À saída do parque de estacionamento alguém tinha parado uma viatura com os quatro piscas ligados, obstruindo o acesso à rua. Ele soltou uma imprecação e respirou fundo. Era preciso ter calma. O dia mal tinha começado. Aguardaria um ou dois minutos antes de começar a buzinar, detestava o som da buzina. Mas não vinha ninguém e teve de apitar, uma, duas, três vezes. Da agência bancária ali ao lado saiu uma senhora, a arrumar papéis na mala de mão. Era ela. Não confiou nos extractos que retirou do multibanco, pensou ele. A senhora sorriu, em jeito de desculpa.
Depois de meter gasolina, estava finalmente na estrada para o trabalho. O trânsito circulava lento, havia uma fila. Numa curva larga conseguiu ver a cabeça do pelotão e o carro pareceu-lhe familiar. Não pode ser ela, praguejou. Mas quando a estrada ganhou outra faixa e ele pôde ultrapassar, ela sorriu-lhe.
Ao chegar, decidiu que tomaria um café antes de subir para o escritório. Era algo paradoxal, mas estava a precisar. Depois chamou o elevador e ele não se movia, alguém o retinha no piso de cima, ouviam-se vozes. Ao fim do que a ele lhe pareceu uma eternidade, o elevador desceu e abriram-se as portas. Antes que ela sorrisse, ele desencorajou-a com um gesto e um olhar fulminador. Nessa altura eram já velhos amigos, ele não precisava de disfarçar a impaciência.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

…todos ralham e ninguém tem razão

A crise divide as opiniões e os comentadores em dois grandes campos. Um dos campos quase rejubila com os acontecimentos, a sua caricatura tem olhos esgazeados e a Bíblia na mão, erguida aos céus. O outro traveste-se por vezes de anjo. O primeiro mistura críticas legítimas com embirrações ideológicas. O segundo exacerba a legitimidade da defesa até à desculpabilização. As opiniões e os comentadores que ficam do lado direito da crise adoptam uma visão do mundo que exclui o estrangeiro; os seus olhos não alcançam mais do que Elvas, Vilar Formoso ou Chaves; depois da fronteira não existe nada, não se passa nada; o mundo somos nós e tudo sucede do que fizemos e fazemos; o futuro está só nas nossas mãos. Os que se posicionam à esquerda, gostariam por vezes de ficar de braços cruzados à espera de cavaleiros brancos que hão-de atravessar os Pirenéus. Entre todas as agruras que a crise nos trouxe, está esta míngua de sensatez que vai flagelando ora um ora outro dos lados onde se posicionam os contendentes.

O fracasso da democracia

A propósito das mudanças de governo em Itália e na Grécia, três coisas podem ser ditas, todas provavelmente verdade: 1) por vezes o povo não sabe ou não quer escolher bons governantes; 2) a ditadura do mercado vence onde falhou a ditadura do proletariado. 3) os antónimos também podem rimar.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Em termos relativos

Se aplicasse o seu raciocínio à generalidade dos salários em Portugal, este secretário de estado teria de dizer que, «em termos relativos», os salários de políticos e gestores em Portugal não são realmente altos: são ofensivamente altos.

domingo, 13 de novembro de 2011

De equívoco em equívoco

O meu início na literatura “séria” foi uma sucessão de equívocos. Um dia, na praia, comprei A Porta dos Limites, de Urbano Tavares Rodrigues, a pensar numa espécie de Twilight Zone. A capa ajudava. Na biblioteca itinerante da Gulbenkian, encontrei A Metamorfose, de Kafka, e talvez o filme A Mosca ainda não tivesse sido realizado, mas foi com esse espírito que iniciei a leitura da obra. A capa ajudava. Algures na mesma época parda (e parva), atirei-me com esperança ao livro de Kundera A Insustentável Leveza do Ser a imaginar criaturas que levitavam, de preferência alienígenas. A capa não desdizia. Finalmente, Fatherland, de Robert Harris, não era bem um livro de guerra como os filmes sobre nazis — embora a capa o pudesse indicar. De equívoco em equívoco, acabei hoje de ler Ferrugem Americana, de certa maneira uma história de desempregados e falhados. Talvez fosse aqui que o destino me quisesse trazer. Mas nesse caso podiam ter-se poupado muitas centenas de volumes.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Robalheira

Quando se envolveram na sua original troca de presentes, Armando Vara e Manuel Godinho não se precaveram contra os sagazes portugueses que comentam notícias online. A justiça pode considerar inocente uma oferta de robalos, mesmo que retribuída com alheiras, mas para os internautas já não restam dúvidas de que entre aqueles dois se cozinhou uma robalheira.

Favoritos?

Uma lista de blogues não é uma declaração de amor. Há sítios onde vou apenas para cumprir a prescrição diária de irritação.

Funcionários públicos

1. Prolegómenos de uma guerra civil
Sim, este é o momento para avançar com despedimentos em massa na função pública: nunca como agora houve tanta falta de mão-de-obra no sector privado. E se porventura as empresas não estiverem (compreensivelmente) interessadas naqueles inúteis, sempre sai mais barato pagar-lhes o subsídio de desemprego do que o vencimento. E como o subsídio tem um prazo findo o qual o desempregado provavelmente passa a indigente, aplica-se uma qualquer lei antiga que determine a erradicação de pedintes do espaço público. Algum dia temos de nos vingar de sermos mal atendidos nas repartições.

2. Dito de outra maneira
Um regime que assentou na oferta de emprego para compensar apoios eleitorais, que ao contratar olhava para o sobrenome no BI e não para o currículo, que criou cargos para este ou aquele amigo, que não se importou com a incompetência de funcionários, que permitiu a ditadura do funcionário (museus e bibliotecas fechadas aos fins-de-semana, porque «também temos direito a estar com a família» ou a ir à missa ou o raio, horários dos serviços à medida do funcionário e não do cidadão), um regime deste género não merece simpatia. No entanto, conviria não fazer política à medida da conversa de café ou do ressentimento ideológico. Conviria não fazer obras profundas no telhado durante o temporal. Uma reforma da função pública que, nesta conjuntura, passe por despedimentos em massa pode trazer interessantes poupanças ao Estado, mas vai engrossar drasticamente o número de desempregados, diminuir o consumo e a poupança das famílias e aumentar a convulsão social. Os fantasmas de há cem anos já andam a ser suficientemente agitados — talvez pudéssemos deixá-los sossegados mais uns tempos, reformando sensatamente, comprometendo-nos a reformas radicais quando a economia puder minimizar os impactos. A não ser que, claro, como parece ser o caso de muitos comentadores, estejamos de tal forma convencidos da nossa pureza e razão que não nos reste mais do que desprezo pelos compatriotas — e pelo bom senso. Precisamos de reformistas, não de pirómanos.

Transportes públicos

Uma reforma dos transportes públicos incluiria medidas que estimulassem e, em alguns casos obrigassem, os cidadãos a utilizá-los. Eles fazem falta e são a melhor maneira de diminuir os impactos ambientais e o consumo de combustíveis. A crise não nos dispensa de pensar no futuro.
Em Portugal precisamos de mais transportes públicos, não menos. A crise abre oportunidades, a reforma de mentalidades é uma delas. Com menos dinheiro nos bolsos, as pessoas estão em condições de serem convidadas a deixar o carro em casa e a apanhar o autocarro, o comboio, o metro. Assim as carreiras sejam feitas a pensar nos utentes.
Mas para os falcões de serviço e a claque que os açula nos jornais e na blogosfera, reforma é sempre igual a cortes, extinções. Tudo tem de ser rentável e o que não for é para fechar. A seguir serão as escolas. Depois os hospitais. Finalmente, qualquer ideia de humanidade. 

Jas-Mim

Adicionei à lista um blogue de um vila-realense a acompanhar atentamente. Jas-Mim.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Declarações prudentes, digamos

A rádio diz que Jean-Claude Juncker «está convencido de que Portugal tudo está a fazer para que os objectivos sejam cumpridos». Ora, como Passos Coelho parece fazer o encomendado e ainda acrescenta uns extras, o que seria lógico ouvir do presidente do Eurogrupo era: Estou convencido de que os objectivos serão cumpridos. Ponto final.
Mas esta gente, na verdade, só não tem dúvidas quanto ao caminho, o destino é wishfull thinking . Logo, também seria honesto se o senhor acrescentasse à frase dita: Portugal tudo está a fazer, mas isso não significa que consiga os objectivos. E, valha-nos São Maquiavel, talvez merecesse uma medalha dos escuteiros por sinceridade total se rematasse: Nem é isso que interessa.

Vale mais um ministro ou um secretário?

A percentagem das receitas dos jogos da Santa Casa anteriormente atribuídas à cultura passam para as mãos de Miguel Relvas, a eminência parda do Governo. Um escritor devia saber que a semântica conta. (E sabe, claro que sabe. É isso que perturba.)

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Conduzir bem

Impaciente, aproveita a curta duplicação da faixa para passar os carros que tem à sua frente. Como pretende virar à direita no cruzamento, liga o respectivo pisca (para ultrapassar não precisou) e confia que todos abrandarão para a deixar regressar à faixa certa. Opera com agilidade, mas precisa de confiar no bom senso e nos travões dos outros para que a manobra resulte sem danos. É a isto que chamamos conduzir bem, este jogar com a previsibilidade e o sentido de responsabilidade (ou instinto de protecção) alheios. Podia ser apenas confiar na sorte, mas não, é conduzir bem. Também funciona quando algum otário para numa passadeira. É só guinar rapidamente à esquerda e logo a seguir à direita, enquanto o outro fica a ver o peão desfilar. Lá está: nisto da estrada ninguém nos bate. (Quer dizer, parece que às vezes bate.)

«Aluno do 5.º ano apanhado a copiar por SMS enviados pela mãe»

Não há como o amor maternal. O filho precisa de passar duras provas na vida e a mãe está ali, do outro lado da linha, firme a dar ao dedo. O caso é inédito (diz o director da escola) mas só na aparência. Na verdade é paradigmático, mesmo idiossincrático (perdoem a rima). Têm sido estes os valores transmitidos às últimas gerações lusas. Pais e filhos concordam: o que é preciso é ultrapassar, não interessa como, os obstáculos que nos separam do sonho português (também temos um). Afinal, para ser assessor não é preciso saber ler nem escrever. 

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Proselitismo

Aos domingos ao almoço a RTP1 apresenta um programa que se chama Cinco Sentidos. Nele, as vedetas do costume dizem as banalidades do costume.  O programa existe há pouco tempo mas não é novo. Veio substituir, sem alterar demasiado, um outro que se chamava Só Visto! e era apresentado pelas mesmas pessoas, tendo como convidados as mesmas vedetas, para dizerem geralmente as mesmas banalidades supostamente divertidas, às vezes montando um consultório emocional. A RTP sempre tendeu para o pechisbeque, mas desde os tempos do inefável Made in Portugal que se rendeu incondicionalmente à cultura pimba, nas suas versões de feira e de jet set. Na verdade, a RTP pôs-se diligentemente ao serviço da causa. Se esta é actualmente a “cultura” hegemónica na pátria muito se deve à acção da televisão pública.
Num país como o nosso, as televisões privadas dificilmente deixariam de deslizar para o género, mas a RTP preparou-lhes a rampa descendente.

Quando Carlos Pinto Coelho tinha no ar o seu Acontece (em horário nobre, veja-se de onde viemos), a intelectualidade de direita agoniava-se. A coisa era paternalista, condescendente, proselitista. Urgia afastar tal produto da TV. Os portugueses não podiam ser tratados como crianças que precisam de quem lhes ensine o caminho. Devia respeitar-se o discernimento dos cidadãos. Importava ser-se mais exigente nos critérios, menos voluntarista e menos inclusivo, mais selectivo. Nem tudo era digno de constar na grelha de um programa de cultura (que, aliás, nem tinha propriamente razão de existir).

Esta é a mesma intelectualidade que assistiu mais ou menos impávida ao proselitismo incansável da televisão (das televisões) em favor da mediocridade. Programas como o Cinco Sentidos — e o género domina as grelhas — não são inocentes. Alimentam-se da cultura dominante e alimentam a cultura dominante. Promovem o statu quo. Ignoram com ferocidade qualquer fenómeno que não se enquadre nos baixos parâmetros por que se regem, não se adeqúe à cultura do supérfluo, do previsível, do ligeirinho, que define o ridículo estrelato nacional.

Recusando (e até com certa razão) o proselitismo de produtos como o Acontece, esta inteligentsia fechou no entanto, alegremente, os olhos ao proselitismo pimba que entretanto ia agindo mansamente, um proselitismo que durante anos fez descer os padrões da opinião pública, estreitou os horizontes da comunidade, acabou com veleidades no que se refere a diversidade e exigência, atrofiou qualquer ponta de curiosidade que despontasse naturalmente nos telespectadores.

O fracasso do país foi também construído com estas ferramentas. A cultura de desleixo e de irresponsabilidade, o gosto pelo efémero e pela aparência, o oportunismo, o chico-espertismo, o baixo nível, a ideia de que o Estado é o Governo ou algo mais abstracto e que os impostos não são connosco, o abstencionismo e o absentismo, tudo o que nos define como sociedade estava inscrito no código genético daquilo a que se convencionou chamar pimba (no início, com um valor semântico pejorativo, mas esses tempos vão longe). E contudo o único proselitismo que foi deveras vituperado era certamente o mais inofensivo.

sábado, 5 de novembro de 2011

Conversas de café

1. Observando a decoração
— O que falta naquele quadro?
— Jeito?

2. Ouvindo a música ambiente
— A música pimba de antes parecia-me melhor do que a de agora.
— Deve ser nostalgia.

3. Olhando a TV
— Olha, um carro da polícia persegue um avião.
— No ar?

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Depois da farra

A cidade acalma-se depois de um dia de festa. As melhores noites para o insone, as mais silenciosas, são as de domingo (ou feriado), as que sucedem o apogeu. Talvez, por entre todas as desgraças, Portugal possa a partir de agora proporcionar ao povo mais noites serenas, melancólicas, introspectivas. Serões contemplativos em vez de madrugadas histriónicas. Níveis menos elevados de adrenalina. Temperaturas mais baixas. Uma certa atmosfera nórdica, favorável aos livros. Mais literatura não fez mal à economia escandinava.

Os dois barítonos

São dois e a um tratam-no por senhor doutor, tem algures um cargo de reverência. Ambos para lá da meia-idade, barba (um) e bigode (o outro), corpos amplos, pesados, rostos desgastados pelos anos e pelos excessos. Solteiros, divorciados ou viúvos. Declaradamente livres. Marcam dia no restaurante e atacam com vigor pratos que encomendam com uma semana de distância. De sobremesa, hão-de querer aletria, «com muita canela». A canela é mencionada com recorrência, é essencial, terapêutica. A determinada altura, juntam-se-lhes as mulheres — amigas ou, desejavelmente, mais íntimas do que isso. É quando o entusiasmo com a comida é substituído (ou complementado) pela excitação juvenil. Eles mexem-se e saltam na cadeira, trocam piadas e pequenos safanões, têm piropos para as mulheres e conversas onde elas se sintam bem, com malícia ora doseada, ora trôpega. Ignoram o futebol na TV. Fazem beicinho, se elas reagem com indiferença a algum dito. Contam aventuras, feitos, com certa gabarolice púbere inconsciente. Planeiam o próximo jantar tentando garantir a presença delas, aceitando sugestões de pratos, antecipando a voracidade e a lascívia.
Vemo-los e os anos desapareceram-lhe do corpo, da expressão, dos olhos, que agora brilham. Adolescentes numa saída de sábado à noite. Apetite de rapazinhos em crescimento. A porem em prática uma corte quase inocente. Homenzinhos em aprendizagem do seu destino de adultos. Vemo-los — e tentamos não ouvir a voz de barítono, tonitruante, que ambos possuem e que atravessa a sala por sobre todas as conversas, todos os ruídos, forçando a partilha do que devia ser privado, desmentindo o quadro cândido, ferindo a ilusão, traindo a realidade, concedendo-lhe uma nota pesada de tristeza e engano. De decadência, se nos sentirmos nessa noite pouco generosos, amargos com a vida.

A bolsa, as agências, os especuladores — o panteão

Os homens (ou os governos) agem, tomam as suas resoluções. Depois, como na idade das trevas, ficam à espera da reacção dos deuses.

Por vezes, as resoluções são tomadas com o ânimo de ir ao encontro do humor da divindade — ignorando que a imprevisibilidade e o capricho são da natureza da divindade.

Virgens são ofertadas aos deuses. Alimentos. Riquezas. O que de melhor a comunidade possui — e no entanto a monção sempre ocorre, ou a seca, a tormenta, aquilo que a cada momento a deidade entende servir os seus interesses. Quase sempre impenetráveis ou indiferentes à humana vontade.

Ocasionalmente, os homens gostariam de acreditar em si mesmos, servir-se a si mesmos — mas falta-lhes coragem e saber para enfrentar a ira e a feitiçaria dos sacerdotes.

Periodicamente, civilizações são extintas — os deuses travestem-se, imperturbáveis.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Pesadelo ou sonho?

Li (ou ouvi?) hoje de passagem que um homem acordou bêbado dentro do carro e, não vendo a mulher ao lado, concluiu que a lançara por uma ribanceira. Tinham saído para jantar e ele bebeu demais, até à inconsciência. Depois de acordar, telefonou à filha anunciando o «crime» e esta chamou a polícia. Descobriu-se então que a mulher simplesmente fora dormir a casa de uma amiga por se ter fartado da bebedeira do marido.
Ao chegar a casa, pesquisei, mas não encontrei a notícia em lado nenhum. Não a inventei, mas vejo-me estranhamente sem mais informações sobre o caso. Teria o homem ficado aliviado ou desapontado com a descoberta da polícia? Em que momento sentiu ele que acordou para um pesadelo: antes ou depois de ser informado de que a mulher estava viva? Por que razão concluiu, ao acordar, que a lançara pela ribanceira? Porque, no seu apagamento alcoólico, teve um pesadelo com isso? Ou porque o sonhou? Ocorreu-lhe a possibilidade do «crime» porque é coisa que, em momentos de exasperação, lhe passa pela cabeça e temeu tê-la concretizado? Ou foi apenas um daqueles sonhos vívidos que nos decepcionam profundamente quando descobrimos que nada aconteceu? Ligou à filha em pânico ou disfarçando o júbilo? Quis abraçar ou estrangular o polícia que lhe deu a boa/má notícia? Se não estivesse bêbado ao acordar (como consta que ainda estava), teria telefonado ou pensado num álibi?
É aqui que o jornalismo difere da literatura. Para o jornal (ou rádio?), o interesse está no insólito do caso, no caricato. Para a literatura (que é o que importa), a questão é entrar na mente dos protagonistas.
De nada me adiantaria, portanto, ter encontrado a notícia no Google: ela não daria respostas às perguntas anteriores. E é por elas que a boa literatura é muitas vezes mais cruel do que as páginas de crime do Correio da Manhã.

Halloween e o fim dos feriados

Não sabia que festejávamos o Halloween, mas hoje tive de esperar que atravessasse a passadeira um bando de esqueletos e bruxas, pelo que a tradição já deve estar instituída.
Talvez isto faça Cavaco rir, com esperança de ver o pândego português escoucear contra o Governo não apenas pelo fim do Carnaval.