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[A propósito deste post.]
segunda-feira, 27 de maio de 2013
domingo, 26 de maio de 2013
Dúvidas
Será que Cavaco, nadando nos seus sapatos tamanho 49, de polegares enfiados nos suspensórios folgados e coçando a cabeça debaixo da careca falsa, vai processar todo e cada português que lhe chamou palhaço? Ou não leva assim tão a sério a vocação?
sexta-feira, 24 de maio de 2013
A propósito de Wagner (ou não)
Há Wagner há duzentos anos, é claro, e toda uma galeria de compositores
antes e depois dele. Mas, embora ame e rejubile com a música clássica (ou
erudita ou o que quiserem), temo ser demasiado plebeu para encarnar um
verdadeiro amante do género. E talvez a pop seja uma sina dos que formam o
carácter nos anos oitenta do século XX.
Nunca nenhum disco tocou tanto nas minhas orelhas
como Snow Borne Sorrow, dos Nine Horses
(David Sylvian). Há certamente aberturas mais respeitáveis nos anais da música,
mas o falso optimismo ou alegria melancólica de “Wonderful World”, primeiro
tema do álbum, é que põe os altifalantes do Chevrolet a vibrar, dando um
sentido ao Inverno ou, se nos permitirmos certa indulgência, um slogan à Primavera.
E depois há o terceiro tema, com o contrabaixo a
marcar-nos a pulsação — cujo título, “The Banality of Evil”, nos pode afinal remeter
para Bayreuth.
Esqueci-me de perguntar
O Blasfémias já excomungou o camarada Carlos Abreu Amorim, CAA para os amigos, depois de este ter traído São Vítor Gaspar?
quarta-feira, 22 de maio de 2013
Frase do dia 2
«Pai de Passos Coelho aconselha o filho a demitir-se. ‘Isto
não tem conserto. Entrega isto.’»*
A argumentação é mais de
avô, mas certos pais conseguem também este grau de indulgência e cumplicidade,
tomando sempre o partido da prole. Como se depois de o estouvado do rapaz se ter
mandado contra o louceiro, deixando tudo em cacos, o avô (no caso, o pai) fizesse
a proverbial vista grossa e, tipicamente, com infinito amor, admoestando o
móvel em vez do fedelho, sentenciasse: «Deixa lá, a louça não prestava.»
Para aplicar um correctivo à
criatura teríamos de invocar uma perceptora. Ou uma governanta mais afeiçoada à
louça do que ao pequeno lorde. Não se põe de parte que ande por aí alguma.
* Jornal I
Frase do dia 1
Jogos de palavras orwellianos são tão habituais neste Governo como respirar. E ele está ofegante.
A frase, bela e lapidar, é
de Pacheco Pereira, a propósito da novilíngua do Governo, onde “requalificar” significa
despedir.
P.S. Pacheco não a escreveu bem assim; retoquei-lhe
um pouco estilo, mas não o sentido.
segunda-feira, 20 de maio de 2013
Livros excessivos
Recomecei finalmente a ler as mil páginas de A Piada Infinita e reencontrei um dos meus marcadores preferidos,
comprado na Casa de Sefarad, em Córdova. Quando no Inverno tentei ler pela
primeira vez o tijolo de David Foster Wallace (como referido aqui) devo ter
usado aquele marcador e nunca mais o encontrei, mesmo depois de o procurar
naquele mesmo volume. E agora não apareceu na primeira sessão de leitura, só à
terceira, juntando-se ao de Carcassone a que tinha entretanto recorrido. Na
segunda sessão aparecera um que o livro trazia de origem, verde, com umas
raquetes de ténis.
Hoje à tarde, enquanto exercitava os bíceps com o calhamaço (minto,
enquanto o tentava encaixar no Skype), um novo marcador verde se revelou. Foi
aí que me lembrei de alguém ter dito que o livro vinha com dois, um para as
páginas principais, outro para as notas.
Há bocado não dava com as chaves de casa e ocorreu-me logo que poderiam
estar dentro da Piada Infinita. Não
estavam. Mas encontrei lá o corta-unhas que usei depois do banho. E o
suplemento de emprego do Expresso.
É por estas coisas que o livro se torna pesado e difícil de ler, não
pela escrita do autor. A Quetzal não podia tê-lo dividido em volumes? Ou pelo menos arranjado uma capa dura? É que daqui a pouco vou-me deitar e já tremo só de
pensar no esforço para segurar o livro. No meu último pesadelo ele
caiu-me na cara. Ainda vou ter de tirar preventivamente a cana do nariz, como
diz que fazem os boxeurs. Apre.
Personagens incríveis: Maria Teixeira Alves
Há pessoas que pensamos que não existem, são mera ficção hilária. Maria
Teixeira Alves, jornalista, blogger e
depósito de preconceitos, é uma delas. Pela forma como escreve e argumenta, é um
permanente atentado à língua e à inteligência. Mas isso não a coíbe de dividir
os jornalistas em duas classes para criar o seu próprio pedestal: os engajados
e os que têm «muito» mérito. «Acho que é fácil perceberem porque continuo a ser jornalista», diz ela sem rebuço.
Leia-se esta pérola:
«Os ignóbeis socialistas e bloquistas vão levar amanhã mais uma vez a adopção de crianças por duas pessoas homossexuais do mesmo sexo que vivam juntas, ao Parlamento. Não se enganem, todas as manifs, todos os Grandolas Vilas Morenas, todos os Galambas e Dragos, todos os actos de terrorismo de interrupção de membros do Governo em actos públicos, têm um único objectivo "dar crianças aos homossexuais".»
A senhora não é uma figura patusca do Portugal profundo, é jornalista
do Diário Económico e escreve no Corta-Fitas. Para uma risada mais cómoda,
pode ser lida no seu próprio blogue, humildemente intitulado Farpas. Mas atenção: Maria Alves avisa que
escusam de ir lá insultá-la, porque ela não dá cobertura a insultos. Não
precisa. Como alguém comentou algures, a sua retórica insulta-se a si própria.
terça-feira, 14 de maio de 2013
Reinterpretando as profecias
Não devia ter-se rido quando lhe disseram que ainda havia de mingar na vida. Não era falta de
vocabulário. Não era dislalia. Não era para rir.
segunda-feira, 13 de maio de 2013
A farsa de Inês (Teotónio) Pereira
Um artigo de Inês Teotonio Pereira no I tem sido vergastado na rede, e não se pode dizer que o não
mereça. Merece-o sobretudo pela inoportunidade e pelo maniqueísmo.
Em tempos melhores do que este, até poderíamos defender a autora na
parte que diz respeito à educação dos seus filhos. Ela é acusada de não os
saber educar e essa acusação é injusta. A maioria dos que a acusam (apegando-se
à irrelevante fábula que ela escreveu em vez de à moral da história nela implícita)
não pode reivindicar para si mesma um trabalho melhor do que o dela. Se o
pudesse, o mundo adolescente não era a barbárie fútil e assustadora que sabemos
ser esmagadoramente.
Os problemas da farsa de Inês Pereira são outros, os que referi.
A inoportunidade. Por mais críticas que haja a fazer ao socialismo (ou
melhor, ao PS, não temos de partilhar do preconceito da senhora quanto à
ideologia), parece um anacronismo ou uma desfaçatez insistir no exercício depois
de dois anos de despautério PSD/CDS. No mínimo, a incompetência e a vilania de
Passos e Portas deveriam moderar-lhe o discurso.
O maniqueísmo. No universo a preto e branco da senhora Teotónio Pereira
o adolescente típico que ela no fundo descreve é “socialista” porque ela odeia o socialismo. Mas na verdade,
não só são também assim “socialistas” os adolescentes PP e PSD como o têm
igualmente sido os políticos desses dois partidos.
O problema português foi (e é) comportamental (e transversal) e a
senhora quer fazer-nos crer que é ideológico. Que os defeitos não são de
carácter mas de filiação partidária. Que não foram a corrupção, o nepotismo, a
irresponsabilidade, o oportunismo e outros vícios da índole lusa a trazer-nos
aqui, mas as convicções políticas de alguns. Que se a ideia de Passos de
criminalizar os governantes nocivos fosse avante se deveriam prender todos os
que professam o socialismo, não os que cometeram crimes ou esbanjaram dinheiro.
No fundo, Inês Teotónio Pereira quer que a esquerda seja não uma posição política,
mas um estigma social, talvez o cadastro policial de uma agremiação criminosa.
Na sua concepção maniqueísta do mundo, Inês Teotónio Pereira não se
coíbe de implicitamente defender que do outro lado da barricada, do seu lado,
as pessoas são justas por natureza, e se têm dinheiro é porque é delas por
direito. O seu penúltimo parágrafo é uma defesa pungente desta ideia. Reparem
que não há lugar no argumentário da senhora para questionar quem tem o
dinheiro. Os socialistas são quem arruína as nações. Os ricos, se têm o que
têm, foi porque, justa e impolutamente, o mereceram. É feio invejá-los.
Proibido questioná-los. E isso que ela diz aos seus filhos e ao país.
Não acabem com a crise
Os meus domingos, sempre que possível dias de retiro, de devaneios
bucólicos, são frequentemente assolados pela perplexidade. Não é apenas o ciclo
da Natureza, o seu definhamento belo no Outono, ou o milagre biológico e estético
da renovação primaveril. Surpreendem-me sempre o amarelo e o lilás de hectares
de giestas e urzes floridas, e nunca fico imune a um bosque renovado de verde.
Mas a verdadeira perplexidade vem quando me encontro sozinho no meio de certa propriedade
onde a beleza outonal ou primaveril dos bosques ocorre como num privativo jardim
edénico. A verdadeira perplexidade e a verdadeira alegria.
Em tempos usada para lazer da classe alta, esta propriedade, privada
mas de (potencial) uso público, foi abandonada devido à mudança dos hábitos de
ócio, à substituição dos destinos turísticos. Na minha infância e adolescência,
o sítio era usado por alguns autóctones para piqueniques, para tardes de lazer.
Hoje, salvo raras e fugazes visitas de um ou outro nostálgico que vem num relance
conferir o estado das coisas, não se vê por ali vivalma, e eu e os meus livros agradecemos.
Faz-lhe uma tangente um rio, com a sua ponte românica e os seus moinhos
em ruínas, invadidos pela vegetação. Tem no perímetro e nas imediações pinhais e
carvalhais. Dentro de muros há uma grande variedade de árvores que para minha vergonha
não sei nomear. Tem diferentes zonas de sombra (densa ou apenas de sol coado) e
prados onde estender largamente o corpo ao sol. Tem memórias em velhas paredes
e telhados abaulados. Não tem gente. Porque, dir-se-ia, este género de
bucolismo já não faz a alegria das pessoas.
Enquanto eu por ali sonho com uma herança que me permita tomar posse daquele
território e proteger o paraíso, outros em gabinetes municipais sonham com
revitalizar a propriedade. Um dos poucos visitantes com quem me cruzo um dia,
informa-me que a Câmara local ficou com a concessão do sítio e pretende resgatá-lo
para uso turístico, construir um restaurante, coisas dessas. Como que a
adivinhar os meus pensamentos (os meus receios, o meu justificado preconceito
em relação aos poderes municipais), a pessoa informa-me também que o primeiro
passo daquela “revitalização”, segundo fonte oficiosa, poderá ser o abate de
pinheiros. Até já estarão marcados. Despeço-me com um nó na garganta a fingir
deambulação sem norte, mas com o pânico instalado de ver com os meus olhos as famigeradas
marcações. Não as vi, mas não fiquei descansado. A ideia, infelizmente, não é
absurda.
Obrigo-me agora portanto a adicionar ao meu sonho de herdeiro um que
prolongue a crise, que inclua o fim do QREN, o fim das ajudas comunitárias a
projectos de revitalização. Um sobre bancarrotas municipais que durem até uma geração
mais verde tomar o poder. (Sim, bem sei que faria melhor em apostar apenas na
quimérica herança ou no desconchavar europeu.)
quinta-feira, 9 de maio de 2013
De regresso ao folclore
Nem todos perdem com a crise. A cultura pimba verifica um recrudescimento.
No interior do país esta curiosa forma de vida rejubilará. Rejubila já.
Os últimos dez anos estiveram ao serviço de uma particular forma de
crueldade: mostraram como Portugal poderia ser culturalmente descentralizado e
como as berças poderiam ser um pouco sofisticadas, cosmopolitas. Em vão. Brevemente
sofreremos não só com o que poderíamos ser mas também com o que por instantes fomos.
Há uns anos só tínhamos saudades do futuro — agora teremos também saudades do
passado recente.
Nada que aflija os nossos conterrâneos que estão no Governo ou que por
lá passaram: cumprindo o seu dever de anjos camilianos, não os ocupa a
decência, quanto mais a província. Mas também seriam de pouca utilidade: a
província dispensa mais fãs do Politeama.
Há os outros, claro, os que vão à Bertrand do Chiado sem ser em
turismo. Mas nem estes evitam a condescendência: se regressam quotidianamente à
terra, fazem-no em safari, embevecidos com o pitoresco.
Não os censuremos, contudo. Se nós próprios temos tanto jeito para fazer
de castiços e saltitantes pigmeus.
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