‘Humans of New York’ é uma página de Facebook que quotidianamente
publica fotografias de nova-iorquinos na rua adicionando-lhes pequenas histórias
ou declarações das pessoas fotografadas. As citações são por vezes apenas
curiosas, mas não raro são surpreendentes revelações de mágoas, traumas,
fobias, ódios, tragédias e até crimes, mas também testemunhos de alegrias,
sucessos, epifanias.
A página não é exactamente anónima (mais de 7 milhões de seguidores, número
quase equivalente à população da cidade), pelo que é possível que muitas das
confidências sejam forjadas. Mas como aquilo se passa em Nova Iorque, cidade com
tanta e tão variada fauna, não custa acreditar que muitas das pessoas acedem verdadeiramente
a que se lhe tire o retrato e roube a alma. Who
cares?, dirão.
O exercício é voyeurista, mas não mais do que o dos escritores que
bebem imperiais, taças de vinho ou, nos casos mais nobelizáveis, café e bagaço
nas esplanadas e fingem compor poemas. Brandon, o autor da página, é apenas um
pouco menos passivo e um pouco mais latoso do que o comum dos Pessoas.
Na verdade, a página é um catálogo de tipos e tópicos humanos. Um gajo
que queira escrever um romance mas esteja sem tempo para ir para a rua fazer
trabalho de campo pode limitar-se a colher do iPad as personagens e a base do
enredo. Depois é só esconder a fonte e escolher um lugar à sombra no Parque
Eduardo VII em Maio.
Eu próprio dei por mim a pensar uma ou outra vez que o assunto para mais
um romance estava ao alcance de um clique (e com sorte o Brandon era
suficientemente porreiro para ceder os direitos da foto para a capa). Contudo, os
ladrões têm uma ética, como se sabe. Ladrão que rouba ladrão até pode ter cem
anos de perdão, mas os melhores, os mais genuínos, preferem o picante e o
correspondente Inferno de roubar as suas próprias histórias.
Be aware.