sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Porque reza?


É alto e tem um porte altivo, quase militar. A mão esquerda agarra o pulso direito, à altura da genitália. Veste como um bancário ou director de serviços em dia de folga, blusão de pele sobre pullover, camisa e gravata. Rosto barbeado e bom corte de cabelo. Está parado em frente ao pequeno santuário à margem da estrada, num rectângulo de relva. Poderia estar a fazer horas, à espera de alguém para almoçar, um cliente ou um colega. Poderia ser um turista a apreciar a etnografia ou a religiosidade locais, curioso, divertido ou encantado com o pitoresco. O seu é um ar de quem estacionou ali perto um mercedes ou um jipe, tem uma vivenda e um T2 no Algarve com uma nesga de mar, filhos na universidade e alguns cartões de crédito. Mas a pose estática, prolongada, o olhar fixo nos olhos da santa, como nos de um interlocutor de carne e osso, sugere que reza.
Será adequado perguntarmo-nos que espécie de tragédia interior se oculta por trás da figura elegante e serena? Que doenças ou que azares? Que consequências da crise? Quantos meses para a bancarrota? Ou acabámos de invadir a privacidade de alguém que tranquilamente veio agradecer a dádiva da vida (e talvez mais uma ou outra benesse)?
A santa, arrumada numa jaula de vidro como um bonsai, de estatura e expressão humildes, como os seus habituais fregueses, parece intimidada por aquela presença. Ou intrigada, como nós, com a mesma incapacidade para sondagens telepáticas (apesar da fama), com a mesma pergunta bailando-lhe nos olhos: porque rezam os ricos?

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Observando a vida selvagem

Numa tarde de um Junho qualquer, houve uma raposa que passou a três metros de mim com vagares de estômago cheio e confiança no futuro. Não se desviou, não se deteve, não eriçou o pêlo ou as orelhas. Limitou-se a seguir em frente, pachorrenta, talvez a caminho de uma merecida sesta. Eu estava um pouco acima do trilho dela, sentado numa rocha, a ler um livro qualquer. O vento era-me favorável, talvez. A brisa não lhe levou ao focinho o meu cheiro e eu não me mexi, excepto pela lenta e cuidadosa, robótica, rotação do pescoço. Mas era difícil não me ver. Saiu do mato e atravessou mais de uma dezena de metros em campo aberto na minha direcção até me ultrapassar pela ilharga. Só teria de levantar um pouco os olhos.
Noutra ocasião (creio que já escrevi isto) foi um lagarto — daqueles grandes, em tons de verde-claro, um pouco mais asquerosos e belos (sabem como é) do que as vulgares lagartixas — que veio postar-se em cima da minha bota. Desta vez estava à beira-rio, numa praia fluvial, sentado nuns degraus de granito que desciam para uma rocha dentro de água, e o livro era certamente outro. O bicho fez-se anunciar com um restolho nas ervas e isso colocou-me, como sói, em modo de stand by. A seguir pôs a cabecita de fora e, alternando os passos com momentos de espera estática e vigilante, a testar-me com incontida curiosidade, pôs as patas da frente em cima da bota. Agradeci não estar de sandálias ou de chinelos. Ou descalço… brrrr. Quando achei que era curiosidade excessiva ele espreitar-me o interior da perna das calças, estremeci um pouco, a manifestar discordância. Fugiu, mas dali a uns minutos voltou, e repetimos a brincadeira, os pés dele (ou as mãos) em cima dos meus.
Tenho destes vícios, gosto de ler nos habitats dos outros e espreitar-lhes a vida. Não tenho um talento particular e fabuloso para “congelar”, fingir que sou uma rocha ou um arbusto. Sou só paciente e curioso e consigo estar quieto pelo tempo necessário. Talvez também tenha um ar afável, não é impossível. Ou inofensivo, pensando melhor.
No domingo passado era um casal. Eu lia, o casal estava na sua vidinha, sem notar o intruso. (Quer dizer, eu tinha chegado antes.) A certa altura ela veio na minha direcção, mas sem a curiosidade do lagarto. Apenas não me tinha visto, como a raposa. Vestia, aliás, um igualmente admirável casaco de peles e tinha o mesmo ar matreiro por debaixo dele. Nas minhas imediações havia moitas e eles tinham estado a lanchar fast food, precisavam de se livrar de embalagens, guardanapos, restos. Ela viu-me quando lhe era impossível deter o gesto. Olhamo-nos nos olhos enquanto o lixo deles descrevia um arco e ia aterrar na ribanceira abaixo de nós. Não havia censura no meu olhar, só reconhecimento da espécie, aquele ar afectivo e talvez um pouco paternalista de biólogo observando in situ os seus espécimes, a vida selvagem. Ela deve tê-lo percebido, porque se endireitou, empinou o nariz, alisou as roupas, como que assegurando-se que trazia posto o disfarce de civilização que lhe escondia a natureza, e foi-se embora a comentar com os seus botões dourados: «Intelectuais do caralho.» Creio que não se referia ao livro que eu tinha nas mãos.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Bertrand

Uma das características da newsletter da Bertrand é raramente anunciar livros. O que é curioso, porque é despachada por uma livraria.
Tive há pouco uma conversa com o meu fornecedor de e-mail e perguntei-lhe por que carga d’água não filtra ele as mensagens da Bertrand como faz por exemplo às que anunciam soluções para encolher a barriga ou esticar o pénis. Disse-me que o facto de o lixo da Bertrand ser exibido encadernado e com lombada confunde a firewall ou lá o que é. Desconfiei. Pareceu-me demasiado humana, aquela firewall, demasiado idêntica ao cliente-tipo da Bertrand tal como o entendem os seus responsáveis. Algo vai mal no mundo quando já nem bichinhos tão briosos e altivos como as firewalls se dão ao respeito.

***

Entrar numa livraria Bertrand (na daqui, pelo menos) começa a ser assustadoramente igual a receber uma newsletter Bertrand. Nos últimos anos os livros foram recuando nos expositores para dar lugar a uma tralha dirigida a adolescentes ou mesas de cabeleireiro, como se o espaço tivesse sido alugado a Hollywood ou à Isabel Queirós do Vale. Não tenho nada contra adolescentes e mesas de cabeleireiro — nada que os tribunais aceitem, infelizmente —, mas o mundo era um lugar menos estranho quando as livrarias apenas lhes destinavam secções próximas dos livros para pintar.
Depois de entrar na Bertrand, um tipo faz slalom entre mesas e prateleiras e lá consegue encontrar aqui e ali um livrito. Nada que impressione. Quando tinha vinte e tal anos, achava que uma livraria era um local onde gastaria o resto da mocidade e toda uma longa reforma, se ficasse lá dentro a ler os livros. Hoje, enquanto vou eliminando todos os volumes que já li (e não leio muito), noto horrorizado que a minha vida vai ser curta, se a medir em obras para ler disponíveis na Bertrand.

Franchise

A seguir aos morcegos, parece que a nova moda «literária» são os calhamaços eróticos duma tal E. L. James. O José Rodrigues dos Santos deve estar radiante. Depois de ter apanhado a onda do Dan Brown, o escriba tuga não se sentiu à vontade com a saga Twilight e ele próprio estava a ficar farto dos seus livros. Agora com este novo fenómeno de vendas pode finalmente iniciar outra fase na sua carreira, para mais num género em que já demonstrou estar à vontade e ter muito para dar ao mundo.

Devo confessar que eu próprio fiquei um pouco entusiasmado com o rumo que levam as modas. A minha vez está a chegar. Já só tenho de esperar pelo próximo passo no mundo editorial — a evolução do soft para o hard — para entrar também no carrossel dos best-sellers. Pornografia será o meu franchise

Do livro das revelações

1. A IGREJA NEGA-LHES A EXISTÊNCIA, MAS A CIÊNCIA PROVA-A — GROTZINGER VERSUS RATZINGER

No dia em que o Papa diz que o burro e a vaca não existiram, sabe-se que o robot Curiosity, que possui um laboratório capaz de identificar compostos orgânicos, «terá detectado algo interessante numa amostra do solo» de Marte. Fontes não identificadas falam em bosta asinina e bovina.

Confira aqui.

2. CEDRO-DO-LÍBANO

Em próxima obra, o Papa revelará que não havia um pinheiro no local do nascimento de Jesus mas sim um cedro-do-líbano. De posse dessa informação, a ministra Assunção Cristas já reuniu de emergência o seu gabinete das florestas (não foi fácil, não havia salas disponíveis, os 678 gabinetes do seu ministério têm de tirar senha para reunir) para dar nova orientação ao sector: a prioridade nacional já não será o Eucalyptus, mas sim o Cedrus Libani, com a graça de Deus.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A contagem do Tempo

O Tempo Contado iniciou uma contagem decrescente. Já só falta uma semana. Ainda falta uma semana.

Esperar o fim no Solar Bragançano


Um destes dias o inimigo chega às portas do burgo — já se ouve o ribombar da artilharia, ao longe, quando o vento está favorável; de noite vêem-se os clarões —, e nesse dia tenciono estar calmamente a jantar no Solar Bragançano. Não conheço muitos sítios onde seja tão agradável esperar o momento da rendição, com uma playlist que inclui Brahms e Mozart, bebendo vinho por um copo onde cabe uma garrafa de 0,75l e nos sugere que afogarmo-nos ali pode ser uma alternativa.
Quer dizer, um tipo deve morrer como viveu, não é?, acima das suas posses.
Há outros sítios elegantes e luxuosos, mas nenhum nos faz sentir em casa como aquele, e a ideia é pensarmos em nós como o senhor no seu castelo. O Solar Bragançano podia ser a casa que herdámos de uma bisavó nascida no dia em que o Eça publicou Os Maias. A casa para onde depois nos mudámos e vivemos uma vida improdutiva e devassa, estourando a parte pecuniária da herança e contraindo dívidas impagáveis. Alguns de nós não têm outra maneira de se sentirem estroinas e decadentes senão fingindo habitar ancestrais solares em vez de apartamentos alugados e escassamente mobilados na Moviflor, com o mapa-mundo pendurado no lugar do Rembrandt.
Quando o inimigo estiver às portas mudo-me para lá, portanto, encomendando uma das várias iguarias não assim tão caras, mas demasiado caras para mim, aceitando ser servido pelos proprietários — um casal suave, encanecido e discreto — como se fossem os meus mordomos com salários em atraso, espraiando os olhos pela decoração genuinamente antiga e fingindo pensar como vai ser duro perder tudo aquilo, mastigando por uma vez sem pressas mas não porque o gastroenterologista o aconselhou, variando de vinho com cada prato, experimentando uma segunda sobremesa, bebericando a aguardente mais velha da casa, aspirando o odor secular das madeiras abauladas com o último oxigénio...

***
Há tempos fiz parte disto como treino. Jantei no Solar Bragançano gastando o que tinha sobrado do salário do mês. No dia seguinte jantei conservas com cebola — mas não me arrependi, que diabo!

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Os meus bêbados

A minha sala é um posto de observação para a noite. Horários favoráveis e esta vocação para a teimosia (mais do que para a literatura) deixam-me de vigília enquanto o resto do prédio dorme. Uma vizinhança de bares providencia frequente fauna que observar. Por vezes apetece-me abrir a janela e informar a rapaziada ébria que não precisa de gritar nem de tocar às campainhas, já estou acordado. Mas talvez não seja a pensar em mim que eles fazem os seus números de «rebeldes» patetas.
De quando em quando, a noite regista mais do que grupos ululantes a circular entre bares, desafiando-se com cânticos hooligans ou remetendo bocas hardcore para o campo feminino. Há ocasionais e variadas zaragatas (com tiros, uma vez; mas nunca vi ninguém a ser perseguido com um machado, como numa existência anterior apreciei de uma outra janela). Há a sempre fascinante e lenta progressão de bêbados solitários ou em pares que (mal) se amparam e que têm sempre uma cantiga ou uma queixa contra o mundo, não só contra a forma como ele insiste em inclinar-se e rodopiar. Há os acidentes de trânsito, geralmente de um só veículo, conduzido por outro género de bêbado, um que prefere enfaixar-se nos carros estacionados do que ziguezaguear pedonalmente nos passeios como bola de flippers, ressaltando em postes e paredes.
Uma noite de Natal houve um automóvel que quis ser uma bola de flippers: desceu a rua ricocheteando nas viaturas estacionadas de um e outro lado da estrada. A faixa de rodagem, de sentido único, não é larga, mas sobra mais de uma mão travessa de cada lado. Quer dizer, se um tipo tiver a pontaria minimamente afinada chega incólume ao ponto onde a rua se alarga e bifurca (alguns ficam indecisos até ao último momento e vão em frente, pelo canteiro adentro ou até à traseira do infeliz que ali tenha estacionado). Mas o álcool e a pontaria são opostos e naquela noite de Natal o tipo veio batendo aleatoriamente do início ao fim da rua, deixando destroços como se conduzisse um Panzer em vez do Mercedes do pai. Levantei-me da cadeira ao segundo impacto e, quando o carro se deteve sem uma roda e sem o pára-brisas debaixo da minha varanda, depois de uma boa meia dúzia de ressaltos, já eu estava a postos para observar os danos finais (e marcar o 112). Durante alguns segundos, não aconteceu nada, ninguém saiu do carro. A noite ficou silenciosa como costumam ser as noites de Natal. O tempo congelou, como as poças da chuva congelam noutras noites. Depois saíram duas pessoas de trás dos airbags insuflados e mais três das portas traseiras. Não houve menos silêncio por elas terem saído: afastaram-se uns metros e ficaram a olhar o carro com pasmo idêntico ao meu. Passaram talvez uns três minutos quando finalmente a cena teve seguimento. O condutor, pouco mais do que adolescente, iniciou uma pouco surpreendente e estupefacta choradeira, encostado a um muro; as moças abraçaram-se, talvez agradecendo a «sorte»; os outros dois colegas masculinos, sacudindo as ideias, ponderaram enviar o condutor para casa, talvez não fosse sensato ele esperar a polícia e o alcoolímetro. Abandonei a cena quando começaram a chegar outros voyeurs e me lembrei que o meu carro estava estacionado naquela rua*.

Hoje houve lá fora um barulho que evocou aquele e me fez sentar ao computador a escrever esta história em vez de ir descansar mais cedo os ossos. E só a escrevi porque a realidade desta vez não fora interessante: era apenas um tipo cuja piela o convidara a deslocar-se pelas ruas arrastando uma chapa que ressaltava nos lancis e nos paralelos.  Às três e meia da manhã, era talvez a memória genética de um caçador-recolector a arrastar a sua presa ou a programação igualmente genética de um «macho viril» a arrastar pelos cabelos a sua fêmea. Ou era apenas eu que precisava de uma história e não de mais um bêbado sem interesse.

* Sobreviveu

IV Reich?


A imagem acima, com que tropecei no Facebook, é de um texto de Vasco Pulido Valente. Prosa de Outubro de 1989, no Independente.
Lembro-me deste artigo (ou de outros no mesmo sentido). O historiador conhecia a matéria e os seus cenários parecem assustadoramente certos, se entendermos a actualidade naquele sentido meio «bélico». Mas é curioso recordar que na altura VPV designava isto como «o problema alemão», quando hoje lhe parece conceder uma certa legitimidade, justeza. Como se o domínio da Alemanha, mais do que inevitável (pela sua pujança económica e pelos erros dos outros países) fosse uma questão de justiça, deixasse de ser um «problema» para ser a recompensa certa e até «moral» pelo seu mérito. Restando-nos, aos outros países, assumir a condição de vermes submissos.
Mas talvez não haja motivos para tanto fatalismo. A Alemanha certamente não se revê no retrato pulidiano de 1989, e talvez no final do dia, fruto de outro «problema» chamado «globalização», precise tanto da UE como a UE dela. Bolas, alguém tem de ser optimista — para pessimista (ou «realista», diria ele) basta o Vasco. De resto, não consta que as suas piores previsões tenham acertado. Por enquanto, pelo menos.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Manifestações

Para alguns comentadores, as greves e as manifestações são apenas folclore e uma maçada. Desvalorizam-nas, negam-lhes pertinência e genuinidade. Recusam aceitar que elas representem comunidade alguma. Defendem que nelas só participam grupos ociosos e/ou radicais, grunhos engajados com o PCP e o BE. Gente à procura de sarilhos e indiferente aos transtornos e aos prejuízos que causam. Os mais extremistas dos comentadores, se pudessem, claro, proibiam as manifestações.

Muitos destes críticos já estavam no activo em 2003, quando por toda a Europa as pessoas se manifestavam contra a guerra no Iraque. Então como agora, vituperavam ou despejavam sarcasmo nas manifestações e nos manifestantes. O argumentário usado não diferia muito do de hoje. Soletrava da mesma cartilha.

Como a História o comprovou, os manifestantes estavam então certos e os comentadores redondamente enganados. Muitos deles não passavam de rapazes iludidos com um ideário, prontos para acreditar em qualquer patranha envernizada da forma certa. As equipas de Bush e Blair confiaram nisso, conheciam o género.
A partir de uma mentira aceite com uma candidez e um voluntarismo surpreendentes, a guerra fez-se, e o prejuízo para o mundo foi tremendo, as ondas de choque ainda hoje se sentem. No entanto, esta rapaziada crítica de manifestações nunca deu o braço a torcer. O problema foi a mentira dos outros, não a sua credulidade pateta. Não ruborizaram quando caiu a máscara. Não sentem remorsos agora.

Contudo, o embaraço de 2003 devia inibir um pouco a seita, fazê-la pensar duas vezes sempre que dispara contra as manifestações. É bem verdade que existem manifestantes profissionais e gente à procura de sarilhos. Não se pode negar que muitos dos que engrossam as filas não têm nenhuma ideia do que estão a defender ou a atacar, muito menos têm qualquer contributo fundamentado para o debate. Mas, porra, quem são estes comentadores cadastrados para, por assim dizer, atirar a primeira pedra da calçada?

Não digo que as receitas da troika incluam mentiras conscientes sobre algo equivalente a armas de destruição massiva. (Também não digo o contrário.) Não digo que todos os manifestantes sejam de uma lisura inatacável. Mas não se deve ignorar que, ao contrário da «maioria silenciosa» supostamente prejudicada na sua inocência com as greves e as manifestações, muitos dos manifestantes, os mais assíduos, são pessoas que não votaram nos governos PS e PSD — o que talvez os alivie um pouco da culpa de termos vivido os últimos tempos acima das nossas posses. E, voltando a 2003, é bom lembrar que a intuição que leva um número crescente de pessoas a manifestar-se nem sempre deve ser menosprezada. Nunca se sabe se não está certa. 

domingo, 11 de novembro de 2012

Assobiar para o lado

Sei alguma coisa de ressacas, mas continuo maravilhado com a do Blasfémias. Quer dizer, já lá vão quatro dias: nadinha a dizer sobre as eleições nos EUA? Quanto tempo vão ficar em negação?

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

A crise e a cultura: manigâncias

O ilusionista Luís de Matos, citado num artigo do JN, vê um lado positivo na crise que (também) afecta o sector cultural: «algumas companhias, cuja razão de existir sempre foi o facto de que certo dia conseguiram passar a ser subsidiadas, vão acabar.»
Aparentemente, este regozijo com o fim de companhias não tem origem num sentimento de injustiça ou inveja, porque no mesmo artigo o ilusionista revela que «só neste ano já fez 40 espectáculos à bilheteira» e, sublinha, «todos com lucro». Luís de Matos não tem portanto razões para cobiçar o famigerado «subsídio». Donde poderíamos concluir que quem se congratula com a extinção de companhias é o cidadão contribuinte que há nele.
Mas não. O seu é um desabafo de agente cultural. Ouçam-no: «A forma como se financia a cultura em Portugal é profundamente desmotivadora para quem trabalha e altamente proteccionista para os chamados subsídio-dependentes». (Luís de Matos trabalha; certas companhias, não, deduz-se.)
Lido com atenção, o discurso do ilusionista revela-se, afinal, apenas mais um lamento pela falta de apoios. Como português genuíno que é, o mágico não se incomodaria com uma ajudinha do Estado. Incomoda-se, sim, com a existência de «companhias que são subsidiadas há mais de duas décadas e, invariavelmente, os seus espectáculos têm 20 ou 30 espectadores». (Não revelou ao jornal se a contagem de cabeças nas plateias, ao longos dos anos, incluiu, generosamente, a do próprio ilusionista.)

Este género de manifestos ocorre com alguma frequência, artistas ou produtores que fazem coexistir no mesmo parágrafo a vaidadezinha pelo sucesso comercial e o lamento pela falta de apoio do Estado. Não notam a incoerência, são verdadeiros artistas portugueses.

Um pouco mais à frente, reforçando a sua perspectiva da crise enquanto bondoso «processo de selecção natural» e a confiança na sua própria fórmula, Luís de Matos diz que «quem faz bem, nada deve temer». Só não explicou o que entende por «fazer bem». Devem as companhias optar pela prestidigitação em vez do teatro ou da dança? Ou acredita o mágico que obteria idêntico sucesso comercial se encenasse Beckett ou mesmo o «imperecível» Shakespeare? Talvez o segredo de ter público para a dança não esteja em levar à cena «O Quebra-Nozes» no Natal, mas em ter o Luís de Matos a interpretar Merce Cunningham ou Pina Bausch. O Estado deveria era despejar dinheiro em produções destas, êxitos garantidos de bilheteira. Quem não pagaria para ver?

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Goddamn!

Curioso. Tirando a Helena Matos a assobiar para o lado (embora razoavelmente certa no assunto abordado), o blogue Blasfémias esteve hoje silencioso. Ressaca eleitoral?