Aparentemente, este regozijo com o fim de companhias não tem
origem num sentimento de injustiça ou inveja, porque no mesmo artigo o
ilusionista revela que «só neste ano já fez 40 espectáculos à bilheteira» e,
sublinha, «todos com lucro». Luís de Matos não tem portanto razões para cobiçar
o famigerado «subsídio». Donde poderíamos concluir que quem se congratula com a
extinção de companhias é o cidadão contribuinte que há nele.
Mas não. O seu é um desabafo de agente cultural. Ouçam-no: «A
forma como se financia a cultura em Portugal é profundamente desmotivadora para
quem trabalha e altamente proteccionista para os chamados subsídio-dependentes».
(Luís de Matos trabalha; certas companhias, não, deduz-se.)
Lido com atenção, o discurso do ilusionista revela-se, afinal, apenas
mais um lamento pela falta de apoios. Como português genuíno que é, o mágico não
se incomodaria com uma ajudinha do Estado. Incomoda-se, sim, com a existência
de «companhias que são subsidiadas há mais de duas décadas e, invariavelmente,
os seus espectáculos têm 20 ou 30 espectadores». (Não revelou ao jornal se a
contagem de cabeças nas plateias, ao longos dos anos, incluiu, generosamente, a
do próprio ilusionista.)
Este género de manifestos ocorre com alguma frequência, artistas
ou produtores que fazem coexistir no mesmo parágrafo a vaidadezinha pelo sucesso
comercial e o lamento pela falta de apoio do Estado. Não notam a incoerência, são
verdadeiros artistas portugueses.
Um pouco mais à frente, reforçando a sua perspectiva da crise
enquanto bondoso «processo de selecção natural» e a confiança na sua própria fórmula,
Luís de Matos diz que «quem faz bem, nada deve temer». Só não explicou o que
entende por «fazer bem». Devem as companhias optar pela prestidigitação em vez
do teatro ou da dança? Ou acredita o mágico que obteria idêntico sucesso comercial
se encenasse Beckett ou mesmo o «imperecível» Shakespeare? Talvez o segredo de
ter público para a dança não esteja em levar à cena «O Quebra-Nozes» no Natal,
mas em ter o Luís de Matos a interpretar Merce Cunningham ou Pina Bausch. O
Estado deveria era despejar dinheiro em produções destas, êxitos garantidos de
bilheteira. Quem não pagaria para ver?
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