É alto e tem um porte altivo, quase militar. A mão esquerda agarra o
pulso direito, à altura da genitália. Veste como um bancário ou director de
serviços em dia de folga, blusão de pele sobre pullover, camisa e gravata. Rosto barbeado e bom corte de cabelo. Está
parado em frente ao pequeno santuário à margem da estrada, num rectângulo de
relva. Poderia estar a fazer horas, à espera de alguém para almoçar, um cliente
ou um colega. Poderia ser um turista a apreciar a etnografia ou a religiosidade
locais, curioso, divertido ou encantado com o pitoresco. O seu é um ar de quem estacionou
ali perto um mercedes ou um jipe, tem uma vivenda e um T2 no Algarve com uma
nesga de mar, filhos na universidade e alguns cartões de crédito. Mas a pose
estática, prolongada, o olhar fixo nos olhos da santa, como nos de um
interlocutor de carne e osso, sugere que reza.
Será adequado perguntarmo-nos que espécie de tragédia interior se
oculta por trás da figura elegante e serena? Que doenças ou que azares? Que
consequências da crise? Quantos meses para a bancarrota? Ou acabámos de invadir
a privacidade de alguém que tranquilamente veio agradecer a dádiva da vida (e talvez
mais uma ou outra benesse)?
A santa, arrumada numa jaula de vidro como um bonsai, de estatura e expressão
humildes, como os seus habituais fregueses, parece intimidada por aquela
presença. Ou intrigada, como nós, com a mesma incapacidade para sondagens telepáticas
(apesar da fama), com a mesma pergunta bailando-lhe nos olhos: porque rezam os
ricos?
por fé...
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