terça-feira, 11 de outubro de 2011

A Primavera Árabe e o Outono Ocidental

1. Tudo aquilo que os jovens da Primavera Árabe sabem que não querem é o bastante para que a sua seja uma revolta evidente, um processo que se auto-justifica e cujos fins são também claros. Em termos gerais, os jovens não querem a ditadura. Ponto. Mais não seria preciso para que a revolução fosse tanto uma vontade como uma necessidade amplas e naturais.

Os jovens árabes — uma boa parte deles, pelo menos — querem liberdade de expressão, liberdade de reunião, liberdade de voto, igualdade de géneros, democracia. Se no fim do dia tiverem conseguido isto, terão conseguido tudo — mesmo que ainda lhes possa faltar muito para uma vida digna e próspera. A vitória das revoltas árabes, fisicamente difícil e arriscada, é intelectualmente fácil de defender e de conseguir. Derrubada a ditadura, estão conseguidos os objectivos; instaurada a democracia, a revolta, esta revolta, consuma-se — ainda que a luta tenha de continuar.

2. Os movimentos indignados no Ocidente não têm a mesma revolução “fácil” pela frente. Aparentemente, também uma parte dos jovens daqui sabe o que não quer (um capitalismo impiedoso, opressor e ineficaz, políticos corruptos, empresários usurpadores), mas não tem algo suficientemente definido e contrastante para lhe opor. Não tem um simétrico óbvio como a democracia o é para a ditadura.

Precisamente porque o que “oprime” o Ocidente não tem a evidência de uma ditadura clássica, não é exprimível em slogans simples e universalmente aceites, por mais que eles sejam tentados e bradados. Ainda que as massas manifestantes se pudessem pôr de acordo quanto à forma de derrubar o “sistema ocidental”, não saberiam, na verdade, o que instalar no seu lugar. Ou sabê-lo-iam muito vaga e incertamente, mais a partir de uma intuição ou de uma fé do que de uma reflexão acabada.

O velho comunismo assusta demais para voltar a ser apelativo e uma alternativa que a classe média, crescentemente indignada, aceitasse. E um “comunismo de nova geração” (necessariamente com outro nome) ou uma “social-democracia economicamente persuasiva” não estão ainda politicamente estruturados e acessíveis ao senso comum, nem se prevê que venham a ser de consenso fácil.

Resulta que dificilmente as ocupações das praças públicas no Ocidente conseguirão, só por si, constituir uma revolta vitoriosa como a árabe o é potencialmente. Talvez as ocupações possam desalojar os poderes, mas não terão nada para pôr no lugar deles. Nem serão tão universalmente aclamadas. O Ocidente está zangado, mas não louco. Não haverá uma ovação quando a desordem for tudo o que restar. A anarquia, se acontecer, como eventualmente acontecerá, não será desejada como a liberdade na margem sul do Mediterrâneo. Reside portanto aqui a dificuldade da revolução ocidental. Se nada de útil for fabricado nos próximos tempos pelos pensadores ocidentais (considerando que existem e que, existindo, alguém está disposto a ouvi-los), na margem norte do Mediterrâneo não ocorrerá uma Primavera mas certamente um Outono invernoso.