Os jovens árabes — uma boa parte deles, pelo menos — querem
liberdade de expressão, liberdade de reunião, liberdade de voto, igualdade de
géneros, democracia. Se no fim do dia tiverem conseguido isto, terão conseguido
tudo — mesmo que ainda lhes possa
faltar muito para uma vida digna e próspera. A vitória das revoltas árabes,
fisicamente difícil e arriscada, é intelectualmente fácil de defender e de
conseguir. Derrubada a ditadura, estão conseguidos os objectivos; instaurada a
democracia, a revolta, esta revolta,
consuma-se — ainda que a luta tenha de continuar.
2. Os movimentos indignados no Ocidente não têm a mesma
revolução “fácil” pela frente. Aparentemente, também uma parte dos jovens daqui
sabe o que não quer (um capitalismo
impiedoso, opressor e ineficaz, políticos corruptos, empresários usurpadores),
mas não tem algo suficientemente definido
e contrastante para lhe opor. Não tem
um simétrico óbvio como a democracia o é para a ditadura.
Precisamente porque o que “oprime” o Ocidente não tem a
evidência de uma ditadura clássica, não é exprimível em slogans simples e universalmente aceites, por mais que eles sejam
tentados e bradados. Ainda que as massas manifestantes se pudessem pôr de
acordo quanto à forma de derrubar o “sistema ocidental”, não saberiam, na
verdade, o que instalar no seu lugar. Ou sabê-lo-iam muito vaga e incertamente,
mais a partir de uma intuição ou de uma fé do que de uma reflexão acabada.
O velho comunismo assusta demais para voltar a ser apelativo
e uma alternativa que a classe média, crescentemente indignada, aceitasse. E um
“comunismo de nova geração”
(necessariamente com outro nome) ou uma “social-democracia economicamente
persuasiva” não estão ainda politicamente estruturados e acessíveis ao senso
comum, nem se prevê que venham a ser de consenso fácil.
Resulta que dificilmente as ocupações das praças públicas no
Ocidente conseguirão, só por si, constituir uma revolta vitoriosa como a árabe
o é potencialmente. Talvez as ocupações possam desalojar os poderes, mas não
terão nada para pôr no lugar deles. Nem serão tão universalmente aclamadas. O
Ocidente está zangado, mas não louco. Não haverá uma ovação quando a desordem for tudo o que restar. A
anarquia, se acontecer, como eventualmente acontecerá, não será desejada como a
liberdade na margem sul do Mediterrâneo. Reside portanto aqui a dificuldade da
revolução ocidental. Se nada de útil for fabricado nos próximos tempos pelos
pensadores ocidentais (considerando que existem e que, existindo, alguém está
disposto a ouvi-los), na margem norte do Mediterrâneo não ocorrerá uma
Primavera mas certamente um Outono invernoso.