O tempo suspendeu-se ali na esplanada. Tudo esteve de alguma
forma pendente da trajectória seguida pelas garrafas de água. Não saberemos que
pensamentos as mulheres tiveram. Talvez tenham avaliado a sua amizade ou tomado
decisões sobre certos aspectos das suas vidas. Não é crível que, como o tempo,
se tenha também suspendido o fluxo de consciência delas e a única coisa a acontecer no mundo, registada pelos olhos mas não pelo cérebro, tenha sido um par de
garrafas a rolarem vazias e sem objectivo pelo passeio de cimento.
O vento incidiu de determinada forma e com energia potencialmente
mensurável. Podemos considerar que houve uma relação directa entre o trajecto e
o tempo que as garrafas demoraram a deter-se e aos pensamentos que tiveram
lugar? Se houve conclusões, poderão elas ter sido influenciadas por aquela
rajada de vento? Seriam outras se as garrafas tivessem descrito outro percurso,
rolado mais ou menos algumas vezes?
Quase certo é que o inverso não se verificou. O olhar das
mulheres não influenciou o movimento das garrafas, a não ser que queiramos dar
crédito à telecinética. Caso o tivesse feito, caso elas tivessem decidido onde e quando paravam as
garrafas, tinha sido uma intervenção inconsequente: não aconteceu nada depois
disso.
Na verdade, nem tudo foi mistério ali na esplanada. Sabemos
que a pausa das mulheres não representou uma tentativa frustrada de vencer
a preguiça ou a indiferença. Sabemos também que elas não gastaram aqueles segundos com a metafísica
do civismo, a ponderar quanta solidariedade lhes merecia o empregado de mesa. Ou
então foi exactamente isso que fizeram — e concluíram que o pobre não lhes
merecia nenhuma solidariedade. Tinha mais era de apanhar o lixo delas, ora
essa.