Um filme é uma porta aberta para um outro mundo. Ou deveria ser. Na esmagadora maioria dos casos, um filme é uma porta aberta para um território que já visitámos, para um lugar-comum, é um déjà vu, um plágio, em suma.
Está errada a ideia de que um argumentista é um criador. Não é. Ocupa na actualidade o lugar que os monges copistas ocupavam na Idade Média. Ei-los ali, pachorrentos, alinhados num claustro, a copiarem pacientemente o modelo que lhes foi facultado, com melhor ou pior letra, consoante a habilidade de cada um (quase sempre escassa — são pouco mais do que ignorantes, iluminados apenas por uma vela, ou uma tocha).
Talvez os argumentistas, inspirados um dia pela obra, seja ela qual for, tenham achado que era sua função propagá-la, como os seus ancestrais faziam com a Bíblia. Não se trata, afinal, de conceber produtos originais, de trazer novidade ao mundo, estimular a imaginação dos clientes dos clubes de vídeo, ou dos assinantes da TV Cabo, do Meo. Trata-se de proselitismo. A obra revelou-se aos argumentistas e eles querem que nos convertamos a ela. À força.
Ou talvez não seja nada disto. Talvez as companhias cinematográficas tenham feito estudos de mercado. Avaliado as capacidades mentais do espectador médio, do cidadão médio, bitola por que o mundo se rege — e se dana. Como pode comprovar qualquer pessoa que já tenha ido a um cinema popular, o espectador médio perante um filme novo, com argumento original, perde-se, não consegue seguir a história, aborrece-se, fica como um boi a olhar para um palácio. O boi quer erva igual e abundante, um pasto a perder de vista com milhões de pezinhos de erva replicando-se exactamente uns aos outros. Porque haveria o espectador médio de ser diferente? Porque haveria de desejar mais do que a enésima repetição do mesmo argumento?
Daí que as novas gerações de argumentistas já não frequentem cursos de escrita criativa. Vestem hábitos de serapilheira e passam temporadas em mosteiros a aprimorar as iluminuras.