Fiquei desolado. A competição para mim acabara. Ou já não competia pela
distância mas para saber se sucumbiria por fraqueza das pernas ou síncope
cardíaca. Arrastei-me como pude para casa, sem swing nem forças, pensando inscrever-me num dos cursos de escrita
criativa do João Tordo — para me manter sob influência ornitológica e, quem
sabe, ganhar finalmente asas. Se não para as letras, para que os 15 km me não pesassem
tanto nas pernas.
domingo, 10 de março de 2013
Ganhar asas
Estou de rastos, se querem saber. Ao acordar li no Facebook que o Possidónio
Cachapa correra hoje 15 km, e eu, que não quero ser menos escritor do que ele,
achei que devia tentar o mesmo. Desci para junto ao rio da minha aldeia, que
não é menos belo do que o Tejo dele. A certa altura, deu-me a modéstia (a
moléstia foi mais tarde) e achei que os meus doze de máximo chegavam para me
garantir um lugar humilde mas honesto nas letras portuguesas. Só que quando já orientava
os passos para o Calvário que me finaliza a corrida resolveu cruzar os céus uma
rara cegonha preta e, claro, fiquei embeiçado. Inflecti e alinhei-me com o rio
da minha aldeia, para montante, como ela tinha feito. Imaginei, na minha idiotez
matutina (para mim é manhã até tarde da noite), que a bicha haveria de aterrar
no mesmo território onde se apascenta a garça-real de que já aqui falei. Entre
ir e vir seriam mais dois quilómetros, calculei. Se swingasse mais um pouco
atingiria os 15 e poderia sentir-me, por direito próprio, alguém do métier literário. Chegado ao local não
havia cegonha nem garça, apenas os sacos de plástico do costume presos nos
mesmos galhos na orla da corrente. Suponho que não se faz poesia com musas
ausentes e sacos do Continente, biodegradáveis que sejam. (Bem, sendo biodegradáveis
e do Continente, talvez a Adília faça.)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
:))
ResponderEliminarGostei.
ResponderEliminar