McEwan resolveu incluir, sem grande disfarce, um curso de escrita
criativa em Mel. Lá se foi o negócio
dos Booktaylors, de Rui Zink ou de João Tordo: os neófitos das letras só têm de
seguir Serena, a protagonista, enquanto ela vai decifrando o método e o
processo do seu amante escritor. Poupam umas coroas e não têm de aturar o ego
do formador. Pelo menos não ao vivo.
O aprendiz tem dúvidas, esbarrou na página em branco, carece de
personagens secundárias ou mesmo de protagonistas? Aprenda com o Tom Haley. A
Serena explica como se faz (ainda que a pobre não saiba quão longe pode um
escritor ir na apropriação da realidade para o texto ficcional.)
O Diário de Inverno de Paul
Auster tem a ambição — menor, mas igualmente útil — de humanizar o escritor. Revelando, por exemplo, que também ele tira prazer de se peidar. Se isto não
ajuda qualquer um a ganhar confiança para escrever o seu próprio livro, não sei
o que há-de ajudar.
E isto, que parece admirável, é trágico. Que os escritores se ponham a
abrir o jogo e a descer do pedestal. Nos dias que correm, já qualquer Zé (eu
incluído) acha que pode escrever um livro; deixando-as suspeitar de que o podem
fazer e explicando-se-lhes como o
podem fazer, manadas inteiras de bisontes hão-de atirar-se ao Word.
A minha esperança é que a concorrência seja tão estúpida como parece e
continue a achar que para escrever um livro não precisa de ler nenhum. De
resto, as tiragens em Portugal dão-me algum conforto. Entre sobras, ofertas e
calços de mesas vai o grosso de uma edição. Talvez três portugueses comprem e
leiam os seus exemplares.
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