Uma das coisas mais difíceis de abandonar no final da adolescência é o
penteado. Demoram-se anos, laboriosos anos, a atingir aquele insatisfatório resultado
complexo e quando finalmente nos resignamos a ele chega a tropa ou a idade
adulta, com as suas convenções, embaraços e barbeiros. Alguns adultos em particular,
tendo atingido o estrelato nos anos setenta, quando eram meros pós-adolescentes,
sentiram-se dispensados de fazer a transição capilar. Um pouco por coerência
com a postura irreverente da época, um pouco por receio de ficarem
irreconhecíveis perante os fãs se uma tesoura lhes passeasse sibilando pela
cabeça.
Na verdade, o estatuto de rocker dos setenta, invocado igualmente por
tanto roadie e fã ignoto, apenas serviu como desculpa para não enfrentar no espelho
a angústia e as indagações hamletianas suscitadas por um crânio nu. É certo que
os fãs reconhecem uma cabeleira de 1975 quando vêem uma, mas acontece frequente
e jocosamente perguntarem: «quem diabo é aquele gajo barrigudo debaixo da trufa
do Robert Plant?» Donde os hoje engravatados descendentes do flower power poderiam aprofundar a
exegese e inferir que a força de Sansão não vinha dos seus longos cabelos.
Por mim, nada tenho contra quem decide ser contabilista, agente
funerário ou pai de família das raízes do cabelo para baixo e manter-se dali
para cima nostálgico de certos riffs de guitarra e torsos nus (tenho até
ternura). A minha preocupação é estética. É que muitos destes homens
esquecem-se também da calvície e a certa altura já nem a barriga nem os três raros
embora longos cabelos que lhes restam evocam algo mais do que uma personagem mal
desenhada de Tim Burton.
Por falar nisso, temos de conceder que é ainda mais embaraçoso ser-se
um gajo barrigudo debaixo de um penteado dos anos oitenta. Bem, sempre foi embaraçoso estar-se debaixo de um penteado
dos anos oitenta, mas é um pouco sádico que continuem a esconder isso do Robert
Smith.
Já os Duran Duran seguiram o caminho sensato que a maioria de nós
seguiu logo nos noventa: aparar as pontas de modo que ainda sobrasse uma ideia
do que tinha sido o nosso penteado e, para combater o sentimento de perda, coleccionar
espanadores exóticos e coloridos.
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