Vi-o
de cabeça levantada — medindo o colosso com ar entendido, o indicador
percorrendo os pisos com minúcia de sapador — e por momentos pensei que estudava
a distribuição de cargas adequada para implodir um dos prédios “Coutinho” cá do
burgo. Mas não. Era só um turista divertido, contando quantos pisos o
mamarracho tinha acima das vivendas em redor, recolhendo amostras para uma
antropologia lusitana, tirando fotos para o seu álbum de aberrações de Portugal.
2.
O anúncio lista os atractivos do apartamento à venda num andar
estratosférico do Porto. Das muitas virtudes mencionadas, só uma é
verdadeiramente irresistível: o andar tem vista para «a relva do Estádio do
Dragão». Não era dito qual dos tufos
da relva do Estádio do Dragão — o anúncio carecia de detalhe.
Mas era um anúncio inteligente, dirigido a um vasto especto
de compradores. Entre os candidatos a morar em tão celestial nuvem estão
inúmeros portistas detentores de binóculos e, desconfio, alguns benfiquistas com
licença de porte de carabina com mira telescópica.
3.
Os edifícios residenciais por vezes adoptam nomes que lhes
garantem distinção, ou, em fase de venda, lhes prometem compradores. Não vi até
à data nenhum título capaz de despertar mais o instinto consumista num sem-abrigo
do que “Varandas da A4”. A A4 é, adivinharam, uma auto-estrada — e alguém concebe
melhor forma de passar os dias domésticos do que à varanda a ver o tráfego
Porto-Amarante? Eu não.
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