Durante as minhas caminhadas no parque — que agora mais do que nunca são noctívagas e portanto distraídas da humanidade e desobrigadas das suas construções sociais —, reúno para um zoológico intransmissível, apanhando-os nas malhas da minha rede neuronal, espécimes de sapos, ouriços, salamandras, insectos, corujas (estas só de ouvido), caracóis, lesmas — e ocasionais adolescentes reunidos em volta de um cigarro de erva como hienas partilhando um cadáver, a mesma disposição para a gargalhada.
Não estava preparado para juntar uma nova espécie à colecção, mas ontem fi-lo com a volúpia de um Nabokov que apanhasse uma ninfeta na sua rede de borboletas. Não falo do casalinho sentado a desoras num banco de jardim, máscara cirúrgica afivelada como numa actualização irónica mas ainda casta de um namoro de sofá. Refiro-me a uma inesperada gineta, de cauda apropriadamente farfalhuda e anelada. Vi-a a seguir a uma curva do caminho e accionei o protocolo que tenho para ocasiões semelhantes: parar para ver, aproximar-me devagar para ver melhor. Pelo seu lado, a bicha fez o que os animais selvagens sempre fazem, indiferentes ao protocolo: escapuliu-se. Procurei-a depois no mato à beira do caminho, cândida e inutilmente. Na selva estaria morto, porque, diz a internet, deveria era ter olhado para os ramos por cima da cabeça.
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