Eles estão nos quarentas. Duas delas
andam pelos trinta e a outra ainda não sabe o que é isso. As despesas da
conversa correm sobretudo por conta deles e abordam dois tópicos: desporto e
saúde. Eles fazem jogging, vão ao ginásio. Estão elegantes,
planeiam maratonas. Já pesaram mais do que deviam e tiveram a respectiva ameaça
de remédios para o colesterol. Agora fazem desporto e tomam atenção ao que
comem. Falam durante um bocado de hambúrgueres, mas só pejorativamente, com
detalhe de antigo agarrado. Comparam dietas de diferentes países, concluindo
que por aqui se come mal (não exactamente do ponto de vista do paladar). Um
deles exibe, como bilhete de lotaria premiado, o ticket de uma
daquelas máquinas que medem tudo: massa corporal, peso, altura, pulsação, tensão
arterial. Trocam informações sobre os últimos valores do colesterol. Falam de
dores nos joelhos e nos tornozelos. E de exames, feitos e agendados. Banais
TACs, mas também endoscopias e colonoscopias. Aqui começa a ser difícil
distingui-los de reformados na sala de espera do centro de saúde. Discutem se
dói, se não dói. Se a anestesia, que se paga à parte, mesmo estando isento, é
uma necessidade ou uma mariquice. Falam da impressão ou emoção (nisto divergem)
de ver no ecrã o interior das próprias entranhas, da dificuldade e do suor da
médica nas manobras de aproximação ao intestino delgado, da limpeza que o exame
revelou (resultado de uma preparação bem feita).
Os elementos femininos vão intervindo a
espaços, tentando fazer humor, aduzindo testemunhos de pais ou tios,
experiências de que ouviram falar. A mulher mais nova há muito que mudou de
cadeira e se recostou à sombra de uma sebe, com ar melancólico, observando o
voo dos insectos à luz dos candeeiros. Quando finalmente dão por isso, as
outras metem-se com ela, perguntam-lhe o que se passa. Ela sai do silêncio e do
torpor com ânsia de palrar: está farta desta conversa, só falam de coisas de
que ela não sabe, de que não percebe nada. Di-lo com uma expressão sinceramente
desolada, de quem queria participar no convívio e se sente frustrado por não
ter as ferramentas, os argumentos — e não, como podia, a vangloriar-se da sua
juventude.
Gostei muito deste texto.
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