«Tudo o que é demais enjoa, e ainda mais quando se faz vida disso. Se ninguém [o] refuta é precisamente porque o cromo se tornou inofensivo por ridículo.»
«Paulo Morais (…) exibe a sua mania da corrupção, de uma maneira insultuosa e quase alucinada.»
A primeira afirmação é de um cidadão qualquer, a segunda é de Vasco Pulido
Valente. É destas duas espécies de cinismo que o país sofre, o cinismo do
eleitorado comum e o cinismo dos fazedores de opinião. Ao longo de anos, Morais
indicou números e nomes para a história da nossa desgraça. A imprensa e a
justiça pouco exploraram as pistas, e o aproveitamento privado do erário
público continuou — como de resto todos testemunhámos, de forma mais empírica ou
mais esclarecida.
Contudo, não ter o denunciador sido amordaçado, torturado ou preso faz
dele um cromo, um personagem ridículo. E a insistência na denúncia é, para o comentador
emérito da direita portuguesa, uma forma de insulto (insulto decerto para os
benfeitores da economia nacional).
Para ser tido como um candidato respeitável neste país, Paulo Morais
tinha de ser morto ou fazer-se matar pelas suas acusações.
A alternativa era ser um betinho palavroso e igualmente inofensivo para
o statu quo como Marcelo Rebelo de
Sousa — e nesse caso não só o bom povo o elegeria como teria a enternecedora
preocupação de VPV com a forma como uma eleição presidencial como esta pode ser
aviltante para um cliente do Gambrinus.
Cromo por cromo, o povo português prefere os de pedigree. E para Valente toda a gente é estúpida, mas há os estúpidos comuns e os nossos (dele) estúpidos.
Um só país, duas manifestações do mesmo cinismo. Não foi à toa que Cavaco existiu.
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