Quando vejo televisão de madrugada, uso frequentemente auscultadores — não quero que os vizinhos dêem pela minha existência e não confio nas paredes nem no chão. Por vezes uso-os mesmo que assista a uma eliminatória de snooker, esse desporto de hordas vociferantes.
Com o som canalizado directamente para as orelhas, é possível ouvir a plateia suspender a respiração em certas jogadas decisivas, instantes de apneia colectiva que duram o tempo da trajectória das bolas. Se estas falham o buraco, a respiração é retomada sob a forma de ohs expirados; se são embolsadas, a plateia usa as mãos como guelras e por alguns segundos respira no compasso minimal repetitivo e vibrante de um aplauso.
Esta forma de assistir aos jogos faz-nos também ouvir coisas inesperadas, sussurros de que não nos aperceberíamos vendo televisão como mortais comuns. Anteontem, decorria um jogo de quartos de final e os contendentes arrastavam-se em jogadas à defesa. Nos phones, entre intervenções do comentador, ouviam-se murmúrios e um deles soou distintamente: «Metam as bolas no cu, caralho. Vão-se embora». Assim mesmo, em português de lei. Reparei então que era um campeonato em Portugal, em Albufeira, e que, dependendo de qual o microfone que estava a captar os sussurros, ou os cameramen não recebiam pelas horas extra ou alguém na sala não era fã de snooker.
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