sábado, 13 de fevereiro de 2021

Wawrinka, o herói trágico

O ténis teve os seus Fab Four, a que chamaram na verdade Big Four, com Federer, Nadal, Djokovic e Murray. As lesões e a baixa de forma de Andy Murray abriram duas narrativas míticas sucedentes: a redução da elite a um Big Three ou a mais controversa inclusão de Stan Wawrinka num novo Big Four. O próprio Wawrinka afirmou, e não com falsa modéstia, que não tinha a mesma consistência dos restantes.

Uma destas noites estive a ver um jogo com Wawrinka no open da Austrália e confirmei: Wawrinka é o meu tenista preferido. O tenista suíço perdeu os primeiros dois sets, recuperou como faz tantas vezes ganhando os dois seguintes, levou o quinto set ao tiebreak, que esteve a vencer por 6 a 1, e perdeu por 9 a 11.

Wawrinka é um campeão talhado para sofrer, serenamente, e muitas vezes perder. É o herói trágico por quem torço, porque só ele traz a emoção da luta, do sofrimento. Nadal ou Federer, mais campeões do que Wawrinka, são emocionalmente monótonos, porque o mais provável é que ganhem, perder seria a surpresa, é sempre a surpresa, até com o quase quarentão Federer. Se vejo um jogo de Nadal é com esperança que perca, ou seja, que haja algo emocionante num jogo seu. Torço sempre pelo adversário.

Nadal pode fascinar pela energia obsessiva e vencedora, Federer pela técnica e a graciosidade, igualmente vencedoras, mas só Wawrinka me põe incondicionalmente do seu lado, a partilhar com ele os perigos, as muitas frustrações — e a verdadeira alegria da vitória, porque rara. Ou mais rara. Assistir a um jogo dos primeiros pode ser uma experiência estética ou dar-nos o conforto de estar do lado dos grandes, dos fortes — mas Wawrinka permite-nos isso e a incógnita do resultado final, a adrenalina extra que essa expectativa segrega. Se o desporto é catarse para o público, Wawrinka oficia-a melhor do que ninguém. Wawrinka interessaria mais a Aristóteles e a Shakespeare. 

Wawrinka não é um herói de Hollywood, antecipadamente vencedor. É um herói trágico. Um herói trágico que se perde não pelo seu orgulho, como em muitos dramas gregos, mas pela sua humanidade. Não é um deus, mas um homem como nós. Um pouco melhor que nós. Um grande tenista.

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