Ontem e hoje assisti no Youtube a dois regressos: U2 e Sinéad O’Connor.
Sendo um genuíno filho dos eighties,
não fico indiferente a notícias que se relacionem com gente desta. Mas ouvi com
total indiferença a “nova” música dos U2 (indiferença não, um tédio assassino)
e com bastante curiosidade a da Sinéad. “Take Me To Church” entusiasma, raios!,
apesar do final fraco e de a imagem da cantora, pareceu-me, não ter escapado ao
Photoshop, ou ao equivalente em vídeo ou maquilhagem.
Nos últimos anos, sempre que calhava cruzar com Sinéad O’Connor no
Youtube, assistia com certo embaraço (e desapontamento) a entrevistas um pouco
constrangedoras de uma senhora de meia-idade desnecessariamente gorduchita,
notoriamente aborrecida e até ressentida por estar a dar entrevistas ou a
apresentar canções, quezilenta, a responder com dissertações esotéricas ou
implicativas, desagradáveis, a questões banais sobre a sua música. O anjo que conhecêramos quando adolescentes lamentavelmente desaparecera sob o
diagnóstico de distúrbio bipolar que Sinéad um dia revelara de si mesma. A
cantora careca — pensava eu, definitivo —, envelheceu mal.
Mas o adulto que agora somos compreende na pele isso de envelhecer e
aprecia novos fôlegos do talento, mesmo que breves e isolados, quando os ouve. Era
este o meu espírito quando, espevitado pelo vídeo, fui espreitar o álbum
completo (“I’m Not Bossy, I’m The Boss”), disposto a perdoar aquilo do
Photoshop. Mas eis que, junto com várias outras canções bem inspiradas, no
lugar de um anjo caído deparo com uma gloriosa Fénix. (Depenada, é certo — mas neste
particular quem esperaria outra coisa?)
Os vídeos de entrevistas e concertos que agora me surgem nos lugares
cimeiros do Youtube mostram uma Sinéad O’Connor coberta de hieróglifos e
Cristos de Cecilia Giménez, sim, mas de novo elegante, simpática, comunicativa,
assertiva, aguerrida, coerente, bem-disposta, exibindo empatia com o público e
os entrevistadores. A interpretar com gosto as suas mais recentes canções e a
emocionar o público e os voyeurs do
tube.
A Wikipedia diz que a cantora já há uns anos tinha desmentido o seu próprio
diagnóstico de distúrbio bipolar, mas isto não me parece credível. Por
definição, o novo momento da cantora desmente-o, aliás. O que me parece é que,
para bem de todos os fãs, finalmente alguém acertou na medicação. Passem a
receita ao Bono.
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