1. Um grupo com
umas três dezenas de rapazes e raparigas, morenos na sua maioria, participa de
uma cerimónia no monumento que homenageia a revolta do gueto de Varsóvia. A
certa distância, estrategicamente colocados nas quatro esquinas de um rectângulo
imaginário, quatro jovens adultos, igualmente morenos, parecem apreciar o
cerimonial, mas percebe-se pelos movimentos de cabeça, pelos auriculares discretos
e pelo volume suspeito ao fundo das costas, sob a fralda da camisa, que montam
guarda. Armada.
Não há polícia polaca (ou loura) nas redondezas.
2. No museu contíguo,
cuja arquitectura do hall pretende
evocar a separação das águas do Mar Vermelho para a passagem franca dos judeus
perseguidos, os seguranças, mulheres e homens, são também morenos. E ríspidos,
rudes, autoritários. Deslocados, pensa-se. O bilheteiro, não divergindo do aspecto
judaico mas menos anguloso e mais bonacheirão e, ao contrário dos colegas na
entrada, simpático e afável, pede desculpa por o preço dos bilhetes não estar
visível e pede desculpa pela rudeza e antipatia da segurança. Sugere que se escreva
à direcção do Museu. Sugere sempre, as queixas são habituais. Ele próprio tem
dito aos chefes que essas coisas são pouco agradáveis.
Ficamos sem saber se ele é o judeu bom no sketch do polícia mau e do polícia bom
ou se concorda genuinamente que é um pouco perturbante (ou pelo menos irónico,
de uma ironia sem riso) que naquele museu se escondam os preços dos bilhetes e
se recebam com autoritarismo rude os visitantes.
Em todo o caso, apropriamo-nos da sugestão da separação das
águas e decidimo-nos pela visita.
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