terça-feira, 4 de outubro de 2011

O ano Maia ou de volta ao modelo de contracção do universo

As desigualdades sociais e o fosso entre rendimentos na maioria das sociedades do Ocidente não têm diminuído nos últimos trinta anos. Muito pelo contrário. Julgo que um economista empenhado e de espírito independente não teria dificuldades terríveis em demonstrar como isso contribuiu para o endividamento dos países e para a crise actual. De facto, o enriquecimento fácil e permanente de uma classe obriga ao endividamento de todas as outras (e das instituições do Estado) sempre que não se queira, como não quis, deixar demasiado para trás as restantes classes. O ar dos tempos foi, é claro, facilitar o enriquecimento dos “ricos”. Mas, simultaneamente, ninguém, nem os ricos, desejava conflitos sociais graves. Sobretudo por isso, foi permitido que toda a sociedade alimentasse ilusões de riqueza, de crescimento acima das suas posses. Não seria legítimo — nem pacífico — defender-se a riqueza apenas para uns poucos, daí fazer-se da avidez uma virtude democrática, estimular-se de forma generalizada o desejo de enriquecimento. O desejo de enriquecimento foi parte integrante do sistema em vigor nas últimas décadas, foi fortemente estimulado, quer com base na crença de que isso faria realmente aumentar a produtividade, quer como branqueamento daquilo que de facto ocupava a classe dirigente: enriquecer mais do que nunca. O que os poderosos faziam não era vergonha nenhuma, era o que se desejava para toda a sociedade. E talvez o método funcionasse, pelo menos durante mais algum tempo, se a avidez dos ricos não crescesse desproporcionadamente com as suas contas bancárias. A verdade é que não haveria crescimento que possibilitasse um aumento indefinido do fosso entre os rendimentos das diferentes classes sem condenar à pobreza a maioria das pessoas. A determinado momento, este universo em expansão teria de se contrair, mesmo que o que habitamos não esteja afinal destinado a fazê-lo.
Esse momento é agora. Mas os ricos não vão desistir facilmente do seu sonho americano. Daí terem as instituições financeiras perdido a máscara e terem passado à admoestação e ao ataque mais abertos do que nunca aos governos perdulários que gastaram dinheiro em utópicas sociedades de bem-estar. Que ilusões alimentaram aqueles governos insensatos nos seio dos seus eleitores? Que esperanças de desenvolvimento permitiram que se gerassem? Que mito era esse da segurança social? Erros, crendices, fraquezas, excesso de sentimentos.
Apesar de alguns gestos magnânimos (que provavelmente apenas foram sinais de um pouco de pânico), os ricos parecem dispostos a defender o seu direito natural a escaparem incólumes a qualquer crise. Com a cumplicidade dos governos, vão continuar a achar natural e a calar qualquer crítica ao desmesurado abismo entre os seus rendimentos e os de todos os outros. No que deles depender, 2012 será o ano Maia para o mundo inteiro excepto para eles mesmos. Se a democracia (ou, mais provável e assustadoramente, a rua) lho permitir.